terça-feira, 27 de fevereiro de 2018
Dia 203
Estou sensitivo hoje, sei lá. A chuva passou, o sol despontou de baixo do mar. É lindo, sabe, ver as cores todas claramente depois de muito tempo vendo cinza. Eu, em meu silencio, consigo deixar fluir, e em um momento eu sou apenas energia que corre e nunca fica estagnada. Por um momento, eu queria não ter tido relacionamentos com meus pais, ou família em si. Eles ficam preocupados, estão sempre preocupados. Agora então? Fico até surpreso por não terem mandado helicópteros e buscas diversas, mas, colegas, devem ter acreditado que eu morri. Na verdade, devem ter acreditado que eu morri antes mesmo de embarcar no navio. Para os que ficam de saco cheio de minha rotina divertida na ilha, lhes conto um pouco de minha história, mas de trás para frente: A minha última fase foi de desapego total, tive que me distanciar de um monte de relacionamentos, sejam familiares, afetivos, enfim, precisei de meu canto, e assim, conheci muita gente, gente que nunca pensei que conheceria, oportunidades se abriram como flores se desabrochando, e eu fiquei imerso no mundo do trabalho, somado com o das drogas e da diversão. Festas na piscina hollywoodianas, escaladas na madrugada em picos nublados, pegar carona com caminhoneiros, cruzar fronteiras para se deparar com um amor de toda vida que durou dois meses, cruzar mais fronteiras para se deparar com o amor platônico dos meus devaneios infantis que costumavam me encher de sentimentos. Antes disso? Bom, antes... Coisas são ainda confusas para eu entender. Depressão, impotência, mas é aquilo, o homem teme o fracasso. A questão é: FODA-SE, AGORA ESTOU EM UMA ILHA, e NADA MAIS IMPORTA. Não preciso provar que sou inteligente, ou engraçado, ou caridoso. Eu simplesmente habito aqui, mais um animal no meio de vários, e a única coisa que me faz sentir especial são essas páginas que vos escrevo, e se perguntam onde arranjei, pois é, náufraga comigo veio minha mala, com alguns poucos pertences, infelizmente nenhum livro, mas felizmente um caderno envolto em uma sacola plástica, era como se eu pressentisse que algo poderia acontecer. E aqui vos escrevo, enquanto meus lápis puderem ser cortados brutalmente como lanças e minhas canetas, pobrezinhas, já com pouquíssima tinta, continuarem pulsando com energia colorida. Eu havia dito, anteriormente em minha pré-vida, que enquanto estivesse vivo, a arte ainda fluiria em meu sangue. Pois bem, cá estou eu, e se há ainda quem considere escrever, arte, pois é, contemplem a grande natureza humana em seu habitat não-natural e olhe, olhe bem para esse cenário: Aqui o homem não é dono de nada, não manda, precisa abdicar de todo seu orgulho, aqui nao há ``com quem está falando``, porque não se fala. O conselho de hoje é : Sente-se importante, animal? Olhe para uma formiga, e se imagine em um fictício mundo dela, pensando: Olha, mais um daqueles gigantes escrotos, espero que ele não me mate. Você tem importância somente enquanto puder dar algo em troca, se sua função social e econômica e tudo o mais colapsar, voce vira um zero a esquerda em um piscar de olhos. Leiam A metamorfose, se puderem.
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