domingo, 30 de setembro de 2018

Cocô reprimido

Estava eu voltando do acampamento, alvorada com os restos de pessoas desse resto de dia que é o domingo, sete e quarenta da noite, noite clara, uns pontos aqui e acolá no céu. Cabe declarar, para o entendimento do fim do texto, que hoje foi dia de parada gay em Copacabana.
Quero ir pra casa, penso, todo queimado de sol, não passei protetor, que minha derme sofra pelos próximos dois dias como punição. Mas antes, o chamado da natureza me vem como um chute nas costelas, me ponho em direção a esse maravilhoso recinto de convívio estritamente masculino, cada um lidando com os próprios negócios.
Pego o papel higiênico que tinha levado para o meio do mato, levo o rolo inteiro para o banheiro, minha colega está do lado de fora com as coisas, duas mochilas pesadíssimas. Passo a catraca, e lá estou eu, nesse recinto de azulejos verdes, passo pelos mictórios, vários cofrinhos de caras que nunca verei as caras, e vou até a cabine, feliz da vida por poder me desfazer desse barro todo.
Começo a me concentrar, a fazer força mental, não pensar em nada, somente o movimento de fazer meu abdome e meu ventre colaborarem, empurrarem o grande conteúdo tripas abaixo...
Quando, de repente, tocam a porta.
-Tem gente. Digo eu, meio constrangido. Tento esquecer a batida, voltar para meu estado espiritual longe da política atual brasileira, longe dos bolos de milhos e do tudo que há de ruim nesse mundo.
Batem de novo.
-Tem genteêe. Digo eu, novamente. Que diabos, será que tem tanta gente querendo cagar assim? Quando cheguei o banheiro estava vazio.
Batem mais uma vez.
-Tem gen-
Dois guardas IRROMPEM ABRUPTAMENTE a porta, arrombam mesmo, e eu patético, as calças arreadas, o papel higiênico na mão, fios de cabelo suado caindo na cara, meus olhos totalmente arregalados, que DIABOS?
-Não vai ficar fazendo sacanagem aqui não, hein- Diz um deles, camisa azul bem passada, sem uma mancha. O outro estava com um cassetete.
-Oi?? Digo eu, ligeiramente perplexo, ainda sem entender muito bem o que acontecia no momento- Estava CAGANDO! Olha aqui o papel!
-Não vai ficar de brincadeirinha aqui não, hein- Diz o outro, batendo com o cassetete na mão.
Eles se retiram.
E eu penso o quão autoritários eles foram.
Até que minha colega ouve um deles falando:
-Depois me chamam de homofóbico, mas eles não respeitam, querem ser respeitados....


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