domingo, 30 de setembro de 2018

Entropia

Saia de tua bolha
Caia, é tua escolha
Vem inverno, morre folha
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Morre, no mais tardar
Para que se lamuriar
Do que ficou atrás
Por tantas árvores frondosas
Que primavera trás
Que podes escalar
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Caia, do conforto da dor
Saia, do teu doce e amargo torpor
Da dor não correspondida
Da tua pálida face
Do teu ácido encosto
Tapas e tabefes
E lhe volta a cor
Ao branco rosto
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Te vira sozinho e desmerecido
Te tomas por vencido
Não teria aprendido
Que estavas preso
Perdido?
Na imensidão
 Aturdido
Um anjo fraco, caído
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Libera-te das tuas correntes
Tira as talas
És médico, tira das feridas as balas
Deixa teu sentimento correr
Voluptuosas enchentes
E deixa tua figura surgir
Para olhos complacentes
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Renasce, do fogo consumido
Erga-se, corpo corrompido
Vês teu orgulho ressurgido
E teu semblante erguido
Encara o desafio despido
Viro rua, equina, tenho ido
Por todo o veneno bebido
Quebre os frascos, anjo caído
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 E pegue os vidros e cacos
Jogue-os do abismo terreno
E transforme ferida fatal
Em arranhão ameno
Permita-se pensar
Em solícita solitude
Se fira, sare, mude
Se vira, se inunde
Permita-se novamente amar
Repouse os carrascos
Escale o fosso
Torne pó
Esses fragmentos de osso
Cesse
O dilacerar
Estanque
Incessante hemorragia
Não há verdadeira
Utopia
Não se deixe consumir
Dia após dia
Entropia

Se estou em silencio

Cocô reprimido

Estava eu voltando do acampamento, alvorada com os restos de pessoas desse resto de dia que é o domingo, sete e quarenta da noite, noite clara, uns pontos aqui e acolá no céu. Cabe declarar, para o entendimento do fim do texto, que hoje foi dia de parada gay em Copacabana.
Quero ir pra casa, penso, todo queimado de sol, não passei protetor, que minha derme sofra pelos próximos dois dias como punição. Mas antes, o chamado da natureza me vem como um chute nas costelas, me ponho em direção a esse maravilhoso recinto de convívio estritamente masculino, cada um lidando com os próprios negócios.
Pego o papel higiênico que tinha levado para o meio do mato, levo o rolo inteiro para o banheiro, minha colega está do lado de fora com as coisas, duas mochilas pesadíssimas. Passo a catraca, e lá estou eu, nesse recinto de azulejos verdes, passo pelos mictórios, vários cofrinhos de caras que nunca verei as caras, e vou até a cabine, feliz da vida por poder me desfazer desse barro todo.
Começo a me concentrar, a fazer força mental, não pensar em nada, somente o movimento de fazer meu abdome e meu ventre colaborarem, empurrarem o grande conteúdo tripas abaixo...
Quando, de repente, tocam a porta.
-Tem gente. Digo eu, meio constrangido. Tento esquecer a batida, voltar para meu estado espiritual longe da política atual brasileira, longe dos bolos de milhos e do tudo que há de ruim nesse mundo.
Batem de novo.
-Tem genteêe. Digo eu, novamente. Que diabos, será que tem tanta gente querendo cagar assim? Quando cheguei o banheiro estava vazio.
Batem mais uma vez.
-Tem gen-
Dois guardas IRROMPEM ABRUPTAMENTE a porta, arrombam mesmo, e eu patético, as calças arreadas, o papel higiênico na mão, fios de cabelo suado caindo na cara, meus olhos totalmente arregalados, que DIABOS?
-Não vai ficar fazendo sacanagem aqui não, hein- Diz um deles, camisa azul bem passada, sem uma mancha. O outro estava com um cassetete.
-Oi?? Digo eu, ligeiramente perplexo, ainda sem entender muito bem o que acontecia no momento- Estava CAGANDO! Olha aqui o papel!
-Não vai ficar de brincadeirinha aqui não, hein- Diz o outro, batendo com o cassetete na mão.
Eles se retiram.
E eu penso o quão autoritários eles foram.
Até que minha colega ouve um deles falando:
-Depois me chamam de homofóbico, mas eles não respeitam, querem ser respeitados....


coletivos

-Por que você não tira carteira?
(Cena hipotética se formando na cabeça
-Linda vida lindo carro tudo certo
Olha, uma borboleta
Ih bati
Morri )
-Por que... adoro coletivos lotados

quinta-feira, 27 de setembro de 2018

quarta-feira, 26 de setembro de 2018

Eu escolho Ou Nova Iorque ou Buenos Aires

antes do casamento, eu e minha segunda mulher passaremos dez dias em uma das cidades que eu adoro. Londres, Paris, Nova York ou Buenos Aires. Nos primeiros cinco, vamos ficar trancados no quarto lendo. Depois, podemos visitar o mundo.

sábado, 22 de setembro de 2018

``Só gente vulgar não gosta de silêncio.``Gente jovem, né, Ricardo. Eu acho que sou uma pequena exceção

quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Então, senhor [X], não sei de qual curso o senhor está falando. Muito menos de qual tese. Vou dizer uma coisa, meu caro [X], curso de direito hoje em dia tem em qualquer esquina. Não me venha falar em tese, tese quem fez fui eu. Aliás vou te dizer: não entendo por que tenho que chamar advogado de doutor. Que tese o senhor doutor fez? E não me venha dizer que é advogado dos dois, porque foi contratado pela transtornada. Você só pode ser igual a ela. Então não me venha falar em curso, porque você fez um que muita gente faz em todas as esquinas do mundo, tese você não tem ideia do que é. Sabe, [X], você no fundo me acha um idiota por ter entrado nessa situação. Não precisa me dizer, cale a boca.
 Não apareça no cartório, [X], porque eu sou perigoso e já estou com raiva das suas teses e dos seus cursos.

segunda-feira, 17 de setembro de 2018

Dois empresários

Cena um
Marília e Joana caminham aleatoriamente pela zona portuária do Rio de Janeiro, caminhando por entre as zonas ligeiramente abandonadas e as que foram selecionadas para ``revitalização``, quando percebem uma área que até esse momento era um armazém abandonado, e agora ocupado pelos sem-teto, repleta de placas e setas indicando que em breve aquela área seria um shopping.
-Tá de brincadeira com a minha cara- diz Marília, incrédula- mais um!
-Que foi? Retruca Joana, franzindo o cenho para Marília.
-Mais uma vez o cenário urbano se digerindo - Começa Marília- marcas do passado sendo levadas, patrimônio histórico perdendo toda sua importância, toda essa cultura do ``agora`` me enche de ansiedades e me preocupa , Joana... o que vai ser desse shopping daqui a cinquenta anos? O que ele vai simbolizar?
-Tudo é propício ao abandono mesmo, Marília! Se acostuma, é a vida na cidade, competição até entre os prédios, informação vem e vai, aceleração. A cidade em si é um desapego, querendo ou não.
-Eu sei, Joana, mas não vê que não tem mais para onde fugir? Estamos saturando nosso próprio lar, daqui a pouco só vão existir essas selvas de concreto que nos apertam, nos causam ansiedades em nossas cabeças e canceres nos pulmões, farmácias, academias e escritórios que sobem até o céu.
-É, essa indução ao consumo extrema sempre me incomodou, sabe. Todo dia é um banner novo anunciando outro celular muito mais moderno que a versão anterior, parece que eles estão se encaminhando para um ideal de tecnologia inalcançável, e nós estamos tentando competir nessa corrida, tentando nos manter atualizados, atuais, acompanhar um ritmo de uma sociedade hiper acelerada, frenética.
-Sim, é exatamente isso. Assim como temos pilhas de shoppings, vamos ter pilhas de lixo, celulares acumulados, junto com as embalagens de todas as comidas rápidas, as latinhas, as perucas não aproveitadas, os aparelhos tecnológicos obsoletos, os relógios que pararam, as carcaças de prédios que não receberam mais investimentos...
Marília encara a placa pintada de amarelo e vermelho vibrante, olha para o céu, com uma névoa espessa de poluição pairando acima da cidade, e suspira.
-E lá vai o cidadão para o matadouro do consumo...
-Você deveria escrever poesia, Marília- Comenta Joana, rindo de uma maneira quase melancólica.
-Mas é verdade!- Retruca Marília, ligeiramente indignada pela não compreensão de sua profunda crítica- Pensa em como as pessoas vão ser condicionadas, atraídas como insetos pela luz, pela ideia de felicidade delas sendo projetadas no comércio, sonhos e ideias vendidos e sendo perseguidos até a morte, um caminho sem fim, uma eterna espera pelo gozo, uma angústia que te condiciona por escadas rolantes, te leva a lugar nenhum, sobe, desce, sem precisar mexer um músculo, é corpo parado, corpo espectador que é manipulado, lhe é vendida a ideia de protagonismo, e como atuar nesse teatro contemporâneo e se afirmar como cidadão?
-Consumindo- Responde, triste, Joana, olhando para baixo, para todas as embalagens que estão na calcada, invadindo os trilhos do Veículo Leve sobre trilhos. Eles, que voam pelo vento, e se encerram na baía de Guanabara, para serem decompostos em duzentos, trezentos anos, plásticos e metais que vivenciariam muito mais que os pobres humanos.
Ensaio dois
-Nem acredito que eles venderam esse terreno enorme tao valorizado antigamente por essa quantia ínfima para a gente.
-Nem eu, Renato, fizemos a melhor coisa, não perder tempo, revitalizar aquele espaço no centro.
-Está cheio de mendigos e viciados em narcóticos e craque lá, Carlos, o que vamos fazer?
-Mandar o Jarbas e o Bruce mandar os caras se mandarem, óbvio. Responde Carlos, simplista.
-Mas Carlos, tem famílias inteiras lá.
-Vamos mandar o Jarbas e o Bruce mandar as famílias se mandarem.
Renato suspira, sua ideologia moral e seus valores entram em conflito por alguns segundos, mas depois ele abstrai, pensando em todo o lucro que irá receber com aquele novo estabelecimento.
-Vamos botar abaixo toda aquela velharia, já falei com alguns políticos, eles se desfizeram de uma papelada que eu desconfio muito ter sido amarelada com grilos, patrimônio histórico vai ficar no acervo digital do Rio Mídia cidade digital.
-Me disseram que estavam até confeccionando um modelo em holograma! Ri Renato, imaginando a ideia de um ``Rio antigo`` girando em laser azul. A ideia lhe agradara bastante.
-E vamos fazer mesmo um shopping exclusivo, contemporâneo, jamais presenciado por qualquer terráqueo? Pergunta Renato, cheio de expectativas.
-Óbvio que não, besta. Vai ser como todos os shoppings, mas a gente vai dizer que é exclusivo, por uns adornos, dar uma camuflada na estrutura básica e esquelética de todo centro de consumo, promover algumas marcas, já tenho contatos com donos de empresas que mal veem a hora de se fincar no nosso solo recém polido, cinza e liso.
Cena três
Estão os dois empresários, Carlos Alberto e Renato Falcão sentados lado a lado, na mesa polida de madeira de lei, e do outro lado desta, os designers de interiores, paisagistas e arquitetos do projeto do novo shopping da praça Mauá. Além desses, assistentes de merchandising, designers, dentre outros.
-Então- Inicia Carlos Alberto, objetivo, entrelaçando as mãos- Queremos um modelo de shopping contemporâneo. Vamos botar obras de arte nas paredes para que de a ideia de...
-Liberdade? Sugere um designer de interiores, meio inquieto, com a perna batucando incessantemente.
-Não, liberdade não!- Exclama Renato, desgostoso. -Liberdade lembra anarquismo e quebra-quebra. Não. Os consumidores e passantes precisam se sentir sufocados
Ouve-se uma tosse aleatória do outro lado da mesa, e um dos arquitetos diz:
-Perdão, o senhor disse sufocados?
-Acalme-se, Anselmo- Comenta Carlos - É apenas um sufocado pelo comércio, aquele empurrãozinho que o cidadão de bem precisa para movimentar essa magnífica engrenagem do capitalismo.
(Um empurrão para que o lembre de seu lugar no fundo do abismo do capitalismo consumista o acorrentando, escravo da obsolência programada...) Pensou Renato, com ambição.
-Continuando, cavalheiros- segue Carlos Alberto - Estávamos querendo implementar algo simplesmente inovador, nunca visto antes em shoppings.
Um murmúrio geral na sala, olhares confusos.
-Vamos botar relógios. Todos eles com maravilhosas obras de arte de nossos artistas brasileiros, e sem ponteiros. Há algo mais inovador que isso?
Um paisagista estende a mão e, timidamente diz:
-Ok, mas... sem ponteiros? qual a funcionalidade disso?
Renato, ultrajado, responde:
-É extremamente funcional! Lembra que o tempo do cidadão circulante é estético, e estética significa implementar sua aparência, e implementar sua aparência significa CONSUMIR MAIS para se adequar mais a estética padronizada e normativa de nossa publicidade e mídia.
-Palmas pela sua ideia, Renato- Comenta Carlos, emocionado- Parabéns , meu colega. Ele bate palmas, olhando cheio de expectativa para o rosto ligeiramente corado de Renato.-Viva o relógio pós-moderno.
-Agora o motivo pelo qual chamamos os paisagistas- Anuncia Renato- No meio do Shopping, confeccionaremos a área Floresta Atlântica. Com palmeiras, barraquinhas em que vendam, podem acreditar ou não, frutas! Totalmente contemporâneo, é o animal vindo a tona no homem que se diz civilizado, é a lembrança do passado, é o Fast-Jungle!
-Para que motivos, lhes indago, camaradas- Emenda Carlos- O cidadão precisará ir até os confins da zona oeste, sul, e hoje enfrentamos uma crise nos transportes, nosso venerável prefeito Bispo mestre Crivella nao ajudou com a frota dos ônibus, e ainda tem a crise.
-Ah, a crise... Reclama um arquiteto, passando os dois dedos pela testa, em um movimento de pinça.
-Fast Jungle. Cobraremos para o cidadão sentir nossos climatizadores e aromatizadores, arranjamos uma parceria com o Glade Toques de Frescor, assim que eles saírem do protótipo de floresta, receberão um adesivo de um Aerosol feliz, cem porcento biodegradável, parceria Cariocaping e Glade. Tudo certo, merchan?
Os homens responsáveis pela propaganda e como ela é distribuída no shopping assentiram silenciosamente.
-E o ar condicionado? Pergunta Renato, cheio de expectativa.
-Dezoito graus, chefes- Responde o engenheiro termo-elétrico- O suficiente para que o consumidor pense que o ambiente fechado é infinitamente mais agradável que o sol de arrancar o couro cabeludo do centro do Rio.
-Perfeito, perfeito- Continua Carlos -E se sentir frio, pode comprar um delicioso chocolate quente em um de nossos quiosques mais próximos.
Com um leve pigarro, Carlos então se prepara para falar:
-Errr... tragam aqui os artistas. Ele olha para baixo, como que envergonhado de pronunciar tal substantivo.
Os seguranças do recinto, Jarbas e Boris, enormes e sérios, entram primeiro, seguidos por dois homens e duas mulheres que pareciam mal nutridos, exasperados, desprovidos dos ternos e formalidades que todos lá apresentavam.
-Boa tarde, damas e cavalheiros!- Diz Renato, que sempre simpatizou mais com os que se denominavam artistas.
Os artistas olhavam ao redor com repugnância e estranhamento, todas aquelas luzes e ambientes polidos, e nada disseram por um ou dois minutos.
-Vamos aos negócios, então- Começa Carlos, impaciente. -A ideia, como já enviado por e-mail, é que na frente da fila de espera de cada elevador, em cada respectivo andar, tenha uma esplendida obra de arte para que o mesmo não se sinta explicitamente subjugado e ofendido apenas com a ideia de ter que esperar atrás de outros indivíduos. Ele pega alguns papéis impressos e entrega aos artistas.-Aqui estão os termos e as limitações dos trabalhos requisitados.
Os artistas não revelaram expressão alguma. Em fato, Carlos se questionaria se algum deles estivesse de fato prestando atenção.
-Como assim, toda cor precisa ser tom pastel? Perguntou Álvaro, um dos artistas.
-Precisamente- respondeu Carlos- o pastel vai ser contraste com o neon berrante de algumas lojas que pagam a Taxa do Neon.
-Taxa do Neon? Pergunta Álvaro.
Bruno, seu colega, que se encontrara ao seu lado, tentou suprir o riso.
-Sim, mais eletricidade, mais atenção puxada para esse estabelecimento, ele precisa pagar ínfimos juros a cada estabelecimento pelo ato de convergir o olhar.
-Favor não esquecer, pessoal- Renato se levanta, fecha os olhos, respira, quando vê que atrai todos os olhares, continua:- Nós aqui vamos inserir pequenos dispositivos de microcâmera wireless em mais de trezentos pontos do shopping. No final das montagens e contagens de olhares, os pontos em que obtivermos mais olhares serão posteriormente vendidos e, em suas imediações serão instaladas telas e Outdoors móveis; então , se desejarem, a prova para o mediador de olhares será realizada na próxima quinta-feira.
-As pinturas precisam ser... precisas- complementa Carlos.
-Geométricas. Diz Renato, desenhando um quadrado no ar.
-Lembrem as pessoas de que elas precisam consumir- acrescenta um designer que só ouviu as últimas três frases e rabiscava no canto de sua planilha- mas não de maneira que venha a soar pejorativo.
Cena quatro
-Professora- estende a mão Lúcia, ansiosa- Eu meio que não entendi muito bm esse conceito de espaço lixo.
Joana alves de santos, professora do Colégio de formação urbanística para jovens, responde:
-Jogamos tanto lixo fora, que uma hora não disporemos mais de meios para dar fim a todo esse entulho, e isso se dá na arquitetura também!
Lúcia passa a mão no queixo, tenta estipular teses em sua cabeça, e diz:
-Mas vamos jogar prédios fora?
O resto da turma ri, e Joana se apressa em dizer:
-Não literalmente jogar fora, mas apagar e acender resquícios de civilização, não tem mais espaço, não existe mais novo, o ''jogar fora'' é a demolição, o abandono, até que o espaço volte a ser , de alguma forma, interessante, para que assim algo seja construido no lugar, com a ilusão de ''novo'', mas é sempre essa ruminação eterna, já saturamos muita da capacidade que o próprio espaço aguenta, a um ponto de nem as pessoas aguentarem mais.
Cena cinco
Poema sobre Junkspace

Cena seis
Monólogo em uma peça sobre o museu nacional, em 15/07/2018
-E o museu nacional queima, mais de 20 milhões de itens danificados, 200 anos de história incêndio abaixo. Lá se vai história, lá se vai marcos desprovidos de marcas publicitárias, lá se vai conteúdo imensurável, de valor incalculável, mas não era rosa e azul pastel, não dispunha de curvas confortáveis ou estímulos rentáveis, não favorecia lucros, terreno insustentável em si. Faltou incentivo, faltou estrutura, mais shopping, menos cultura. Mais copiar, menos criar. Menos terreno para se cultivar, mais para se acumular, menos para se pensar, mais para consumir. Um dia, essas edificações podem todas sumir, quem irá lembrar? Da estrutura, sobram ossos, vão aos poucos ruir. Quem tem poder vai chegar para os curvados e dizer: vamos pensar, é simples o que fazer: Vamos vender, facílima questão. Levar abaixo, demolição. Depois, talvez, um parque de diversão. Um museu, que ideia, como podemos assim, manipular a plateia?
Passado? Apagado. Ditadura, não aconteceu, colonização, não aconteceu, autoritarismo, não aconteceu, nossa história, nossa arquitetura, nossa cultura, derrubem tudo e ponham shoppings no lugar. Shoppings, onde poderemos controlar quem irá transitar. Estado falido, finge que é dono, não dá verba, abandono, mais que se importar. Empreiteiras, empreitadas, quem consegue se manter no poder? O que consegue se manter no lugar? Não adianta suplicar, senador não corresponde, não adianta implorar, governador se esconde. Fugir? para onde? Templos religiosos erguidos, é o tecido a se refazer, templos religiosos destruídos, há toda uma seleção, podem ver. E aqui está uma pergunta em que encerro, e a indago em toda aula, a cada manhã: Como pode um povo ter ideia de nação, se se apaga o passado e vangloria o amanhã?

domingo, 16 de setembro de 2018

pessoas

Por vezes eu penso nos corpos que já experimentaram o meu, os quais já vivenciei. Eles aparecem quase como em uma vitrine , alinhados, cada um com suas características físicas, e queria ter também uma biblioteca de gostos e cheiros. Iria ter o perfume fortíssimo do cara que eu encontrava nos meios de 2014, junto com uma pele sempre quente, grossa, peluda, e um hálito sempre reconfortante. Ao lado desse, teria o cheiro do primeiro homem que eu transei, com um desodorante masculino padrão e, não sei, algo de exótico que vinha ao meu nariz, um cheiro caseiro e único que só voltando para lembrar. Embaixo, o cheiro de camomila do cabelo de outro, e cheiro de roupas limpas, passadas, bem lavadas com amaciante. Empilhado em cima, cheiro de maconha e cabelo. Só isso, maconha e cabelo, mas era um cheiro bem interessante. Passei a fumar constantemente ano passado mais por causa dele, então sempre me remete. Um dicionário de toques ali ao lado, também. Um toque desinteressado, um mais afetuoso, outro carente, outro quase cauteloso. E os olhares, queria ter um mecanismo pelo qual pudesse relembrar todos os olhares penetrantes que olhavam bem dentro das minhas pupilas. Seja os verdes citrino estranhamente virados para cima em êxtase em entrega total, esse verde tao ínfimo tao grandes são suas pupilas, tamanho seu afeto, tamanha sua empolgação, suas pupilas querem explodir e transcender as iris. Ou os verdes profundos e ligeiramente amarelados procurando algo que tenha se perdido no seu vazio e na sua amargura, ou então os castanhos sorridentes, olhos que falam muito mais que qualquer palavra, lindo teu silencio. Os verdes acinzentados que me olhavam com tanto amor que pareciam explodir, olhos melancólicos, olhos que choram, seja de felicidade, de tristeza, choram e pedem mais, suplicam. Também tem os olhos negros de obsidiana, frios e calculistas, mesmo com todo teu calor, seus movimentos matemáticos analistas por trás de qualquer gesto de afeto. Olhos de cobiça, olhos distantes... Sim, você mesmo. Olhos em outro planeta, tentei te trazer a tona, deu certo uma vez. Olhos manipuladores, empoderados, olhos de mil anos, olhos controladores, para longe foram, para o desconhecido se viram. Olhos cansados, acostumados, olhos de paz, castanho-mel , olhos de tranquilidade. Olhos ansiosamente felizes, um tanto beneficamente perturbados, inquietos, olhos de aventura, olhos que precisam ficar vermelhos para se aquietarem, escuros mas que não escondem nada, olhos fáceis, que dá para ver seu raciocínio, seu processo de pensamento, sua reação, faz par perfeito com sua voz animada. Esses e maissssssssssssssssssssssssssssssssss

precisamos

Tenho necessidade de silêncio e, de vez em quando, afasto-me para organizar a cabeça
Casei com um homem que não viveu. O Ricardo ficou trancado dentro de um quarto lendo a vida toda
E leio isso estando trancada em um quarto
No fim de semana todo
No mes de setembro todo
Viva Ricardo lisias

sábado, 15 de setembro de 2018

Esse dia

Poderia não estar acontecendo
Divagando
Sem energia pra mais nada
Eu durmo como e lembro
Preciso estudar
nunca suficiente
Preciso ler
Nunca suficiente
Preciso produzir
criatividade caindo
AAAAAAAAAAAAAAAA
tum
caiu

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

Crítica

Blá blá blá
Vem criticar
Vem dizer
Quem pode ser
Artista bom artista mau
Faz por merecer
Tem é canal
Saber enriquecer
Se tem gesto
Se eu presto
Balela
Pega os teus curadores
e dá trela
Arte e ciência
Nada de incentivo
Dá-me paciência
Seis horas semanais
De modelo vivo
Molda corpo
Menos humano
Menos mundano
Eleva arte ás alturas
Para despencarem sem dó
Pelo esquecimento do pó
Dos armários empoeirados e sombrios
Do papel amarelado abandonado
Dos cantos feios frios
Da obra desconhecida
Jamais divulgada
Jamais contemplada
Quem está na moda
É fogo, é foda
Um quadro apagado no banheiro
Um papel e um isqueiro
É, quem escolhe o local de vislumbre
Quem tem voz
Quem tem dinheiro
Quero saber do mercado
Sou artista prostituta
Vendo alma , vendo interior
Vendo quadro, vendo cor
Quero saber da crítica
Da política
Quero saber dos que vão
Me comprar
Me fazer subir
Me idolatrar
Me consumir

mezzo bebada

Te pintei
E voce me pintou
Com o pau
Risos
Frisos
Freios e arreios
Quero te cavalgar
Hehehe
Nao deixo me domar
Pelos teus olhos
Com pupilas hiper dilatadas
Parece que sempre está delirando
De prazer
Mesmo sendo ínfimo
Pequeno infinito
É fantástico
E teu gozo, sinto
E teu beijo, sinto
E teu hálito
E sua palidez
Tao perto mas tao longe
Nao há de sumir
Tao longe tao perto
Quero te consumir

terça-feira, 11 de setembro de 2018

AHH LINKIN PARK

Ah chester
que dor
Ouvir tua voz
Ouvir esse cd lançado a uns vinte anos
DONT STAY
Cara, eu nao tenho nem palavras
Isso nao é um texto
é um desabafo
Ouvir e lembrar de todas as vezes
Que essa música me fez refletir
Que eu a ouvi
Aaa
Nunca mais irei ver um show
Nunca mais ouviremos sua voz
Nunca mais ouviremos teus gritos
silenciado
bom
tua agonia chegou ao fim
Ninguém mais ficou
No negro dos teus olhos fechados
Da sua não existência
Apenas retorna a consciencia
Dos que lembram
O vermelho do teu sangue
E a dor nas suas palavras
No seu tom
A lembrança vaga
da sua voz
É mais fácil correr
que se deparar com essa dor

Se eu pudesse mudar mudaria
Refazer todo ato errado que eu fiz
Ai ai
Que dor
Que melancolia
A vida é foda
Foi muito cruel contigo, Chester
AH NUMB
Mesmo sendo tao batida
Mesmo tendo ouvido isso nos últimos dez anos direto
Eu nao consigo nao admirar
É uma puta música
Voce era uma pessoa incrível, Chester
Mesmo com tuas frustracoes
seus abandonos
Suas cicatrizes
Que dor quando escuto
Imagino voce no estúdio
Gritando
Exprimindo todo esse sofrimento
Essa indiferença
Que agonia em pensar
Que já é passado
Já é era
Já era

só mais uma

Para cada Central Nuclear é preciso uma porção de poetas e artistas, do contrário estamos fodidos antes mesmo da bomba explodir.”

latente preconceito antibiológico da nossa cultura

aceita que transa
aceita que fode
aceita que geme
Que adoece
que cospe
Que engasga
Que come
que chupa
Que dorme
Que goza
Que boceja
Que lateja
Que treme
Que esquenta
Ou esfria
Que dança
Que mexe
Que cheira
Que sente
Que urina
Que sua
Que sangra
Que tateia
Que enxerga
Que ouve
Que rasteja
Que corre
Que pula
Que co
pula
Que tremula
Que entope
Que doi
Que faz doer
Que toca
Que entoca
Que sufoca
Em seu mesmo invólucro
Que escala
Que tapa
Que cava
Que faz aparecer
Que acorda
Que limpa
Suja
E muda
silenciosa

mais análises

O ser humano, alguém já disse, ainda é afetado por tudo aquilo que o relembra inequivocamente de sua natureza animal. Também já disseram que o homem é o único animal cuja nudez ofende os que estão em sua companhia e o único que em seus atos naturais se esconde dos seus semelhantes

domingo, 9 de setembro de 2018

Astronauta

Somos todos astronautas
Cada um em seu capacete
Em seu próprio universo
Descobrindo
E desbravando a vida
Aventurando-se por aí
Falando com aliens
Achando que eles te compreendem
Teu estranho dialeto
Cavando terras vermelhas, azuis
Roxas
E percebendo
Que sabes tao pouco
Mas tao pouco
Não emite nem som mais
Está rouco
Ainda não louco
Ascende e paira
E contempla
Acha que sabe algo
Até se deparar com nebulosas
Que se fazem perder
No escuro denso de suas fumaças
Caminhos a percorrer
De onde não se tem ponto de chegada
Nem início 
E a imensidão é tamanha
Micro e macro se unem
Se espremem, contraem e dilatam
Teu tamanho é único
Universo de átomo
E átomo no universo
Caminho inverso, reverso
Nada mais importa
Não há portal está tudo
Escancarado
Teu brilho ofusca as estrelas
Reflete no teu capacete
E lá vai, sônico
Mais um foguete
Mais um lembrete
teu corpo é
Um frágil palacete
Que te abriga
e te obriga
a continuar

a vida me ensinara a pensar,

mas pensar não me ensinara a viver

sábado, 8 de setembro de 2018

Não vou convidar ninguém

Não venha
Para uma transa rápida
Não venha
Para uma conversa motivacional
Não venha
Para ver desenho animado
Não venha
Para cozinharmos algo
Não venha
Para me fazer companhia
Não venha
Para nos tirar de casa
Não venha
Para nos distrair
Não venha
Fique e se mantenha
E eu vou
Para algum lugar
Penha?
Algum lugar
Que me comporte
Alguma lamina
Que não mais corte
Cega, cega, cega

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

hehe

Quando saiu do banheiro a garota estava nua, deitada na cama, de bruços. J.J. Santos tirou a roupa e deitou-se ao lado dela, fazendo-lhe carinhos, olhando-se nos espelhos. Então a garota virou-se de barriga para cima, um sorriso nos lábios. Não era uma garota. Era um homem, o pênis se refletindo, ameaçadoramente rijo, nos inúmeros espelhos. J.J. Santos deu um salto da cama. Viveca postou-se de bruços, novamente. Virando o rosto, encarou J.J. e perguntou com doçura, você não me quer?

Espero que nao seja frango

Duro
Mas que seja algo mais legal de comer
se bem que
Nao estou com muita vontade
de fazer todo o imenso percurso
Até o bandejao
Sao seis e tres da tarde
Li o dia inteiro
Esse foi meu feriado
Amanha vou para tirar os cravos da cara
E espero que meus cravos sejam retirados
Minhas acoes se encerram em si
E isso sou eu crua
Fria
franca
Uma pintura
Preta e branca
Eu juro que queria, meu amor
Ser o perfume que encobre teu suor
Ser o que olha e faz brilhar
o que nao para de amar
Mas chega
sou só o que respira
Por vício
O que não vê grande sacrifício
O que não vê de tanto olhar
Sou a lágrima que já caiu
A puta que não pariu
A ponte que partiu
A que não achou graça
E mesmo assim riu
Sou o ruído no microfone
Que foge do drone
E das cameras
Que insistem em capturar
Mas agora, nao
Está tudo desligado
E estou do avesso
Isso sou eu maquinada
Um cidadão antes travesso
Uma alma desligada
Vigilante, não operante
Juro, já tentei mudar
Mas nesses tempos
é difícil
Como proceder, como comportar
Tanta energia e informação
E para onde olhar
O que falar
Opto por calar
assim proceder
Ler, captar
E depois interpretar
No silencio das nuvens
Que passam sem perceber
nas cores que esmaecem
seu doce perecer
Minha poesia é ultrapassada
É claro perceber
Espero que seja carne assada

achei genial

 Mas não era apenas isso que nos ligava. Se você não tivesse uma perna eu continuaria te amando, me dizia ela. Se você fosse corcunda eu não deixaria de te- amar, eu respondia. Se você fosse surdo-mudo eu continuaria te amando, dizia ela. Se você fosse vesga eu não deixaria de te amar, eu respondia. Se você fosse barrigudo e feio eu continua-ria te amando, dizia ela. Se você fosse toda marcada de varíola eu não deixaria de te amar, eu respondia. Se você fosse velho e impotente eu continuaria te amando, ela dizia. E nós estávamos trocando essas juras quando uma vontade de ser verdadeiro bateu em mim, funda como uma punhalada, e eu perguntei a ela, e se eu não tivesse dentes, você me amaria?, e ela respondeu, se você não tivesse dentes eu continuaria te amando. Então eu tirei a minha dentadura e botei em cima da cama, num gesto grave, religioso e metafísico. Ficamos os dois olhando para a dentadura em cima do lençol, até que Maria se levantou, colocou um vestido e disse, vou comprar cigarros. Até hoje não voltou. Nathanael, me explica o que foi que aconteceu. O amor acaba de repente? Alguns dentes, míseros pedacinhos de marfim, valem tanto assim? Odontos Silva

sábado, 1 de setembro de 2018

Corporeidade aula dois

Cheguei a aula, tudo tranquilo, cantamos uma música agradável que o professor mesmo fez. Era algo como :
-Vou dar uma volta no mundo
Na volta que o mundo dá
Cada um é cada um é
No desejo e no sonhar
Me senti... Bem. Depois de entoar essas palavras, primeiro recebidas com estranheza, não cantava em aula fazia muito, senti como se elas estivessem entrando em minha carne, mostrando percursos e caminhos a percorrer nessa imensidão de mundo, e como os encontros são efêmeros, a aula um me lembrou essa questão, e além disso, como cada um realmente é único, como histórias são bizarramente diferentes entre si, e como todos esses corpos que ali se apresentam convergem na aula, um universo no meio do fundo da cidade. Bonita a música, professor. Me remete brasilidade, mesmo sendo metade sérvia e, por vezes, ter problemas de não me achar pertencente, sei que é insegurança da minha cabeça.
Nessa aula exercitamos, mais uma vez, a conduta silenciosa, não se comunicar através da fala, meio convencional entre humanos, e tão mal-interpretado. Houve distrações e, posso afirmar, não estive tão concentrada quanto estive aula passada, mas vou tentar manter a expressão neutra próxima aula.
Fizemos uma roda, e nela demos as mãos, nos aproximamos, afastamos, cantamos. Depois, voltamos
EU ESTAVA FAZENDO ESSE TEXTO HÁ UMA HORA, E PROCRASTINEI, fiquei fazendo questionários de TCCs do pessoal da arquitetura/Eba.
Enfim, voltando aos encontros efêmeros:
Houve a questão de dar a mão para o colega e continuar andando, e vi muitas vezes a quebra da comunicação não verbal, anexada com o desespero de alguns para se juntar, pessoas interrompendo seu fluxos para se juntarem. Quanto a mim, tentei agir da maneira mais natural e segurar na mão do outro. Para mim era mais fácil se atar a desatar, era como se andar com a pessoa, como a pessoa, era entrar em um universo diferente, uma temperatura da palma da mão diferente, um respirar diferente, um olhar de canto de olho, ligeiramente oscilante. Volta e meia me via conduzindo, mas ás vezes era conduzida, e não gostava de tomar a mesma direção dos demais, num movimento que se consolidou circular e pulsante, queria ir contra a corrente. Esse ímpeto de traçar meu próprio caminho me deixou ligeiramente incomodada, especialmente com as ''mãos'' mais autoritárias, que impunham um passo mais acelerado, em desarmonia, e assim meu percebia o quanto realmente pode-se causar atritos entre relações não acertadas, onde não há trocas, concessões, apenas imposições. Enquanto vagava sozinha em um dos momentos, dei um esbarrão de frente com uma garota, e senti como se fosse o momento em que na vida, acontece de machucar alguém sem mesmo perceber, a pessoa simplesmente aparece na sua frente e o freio é difícil de puxar. Idas e vindas, pessoas aqui e acolá, não foi estabelecido o círculo de maneira não verbal, a interferência da voz se fez presente. Depois, a intervenção do outro sobre a sua imagem. Me senti ligeiramente abobalhada, com os movimentos curtos que fizeram em minhas mãos, e como ocorreu esse deslocar, essa mudança na expressão. Entoando a palavra que designávamos a nossos corpos, a minha se encaixou perfeitamente com a pose: Desajeitado. E lá ia eu botar a mão acima do peito e elevar a outra até a cintura, um movimento bem sutil. Foi interessante perceber o outro coreografando a mudança, a intervenção, como nosso ''eu interior'' se julga e é julgado, e como somos moldados não apenas pelos vícios de pensamento, mas pelo olhar do outro, que nos faz tão diferentes. Tão diferentes mas de carne osso e sangue, iguais. Vi colegas mudarem sua palavra primordial, como se a antiga não coubesse mais, como o professor mesmo disse, e Tales antes dele, um rio nunca é o mesmo rio, um minuto depois não somos os mesmos. E via todos aqueles corpos, com trejeitos diferentes, palavras diferentes, julgamentos diferentes. Viva a diversidade. Cantamos enquanto repetiam os gestos, cada um com seus afetos e vergonhas sendo ligeiramente exposto, se libertando de uma timidez talvez, uma insegurança qualquer.