segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Décimo segundo andar

Segunda feira.  Depois de um treino, eu suada, querendo subir logo pelo elevador de serviço lento. Abro a porta para uma mãe e sua filha, morenas, a mãe alta de cabelo liso preto, bonita, e sua filha, fofa, de cerca de uns cinco anos, eu presumindo, apenas. Mas sou boa em deduzir idades.
A criança aperta o seu andar, com certo esforço, pois mora no decimo segundo andar.
Eu, sem pensar sobre a mágica que os botões exercem sobre as crianças, apertei o meu andar.
Ela gostaria de ter apertado para mim.
Vacilei.                       
- Você é do sete – ela diz para mim, entusiasmada.
Respondo: Sim... Cansada e sem a mesma energia.
-Eu sou do doze! Continua ela.
- O meu é mais alto!
Eu tento rir, tento dar a interação que ela deseja.
-A minha mãe não me deixa chegar ``na`` janela. Bufa ela, como que reclamando, mas de maneira fofa. –Só acompanhada de um adulto.
E eu falo a coisa mais estúpida:
-Um dia você fica grande e pode ir sozinha.
Eu comecei a pensar em coisas super negativas, como: você pode chegar na janela, sozinha, daqui a quinze anos, perceber que seus sonhos eram uma mentira, depois de ter se perdido no mundo e visto o quanto ele é ruim, você pode visitar a janela sozinha sim,..
Mas eu estava me contendo, pensando:
ELA É UMA CRIANCINHA, NÃO FALE NADA PESADO, VOCE ESCREVE SOBRE ISSO DEPOIS.
A mãe dela olhando para ela, como que achando que estava me incomodando.
-É muito alto. –Prossegue ela - se eu cair eu abro um galo na minha cabeça
E lá fui eu pensando.
Querida, eu presenciei dois suicídios em frente ao meu prédio, dois casos de homens que aparentemente se jogaram de andares bem altos, e nenhum deles ficou com um galo na cabeça.
Se você realmente caísse, seu corpo iria se fragmentar em partes,  o seu sangue iria banhar o asfalto, seus membros iriam se distorcer nos mais estranhos ângulos, seus pais chorariam, ah, chorariam, uma multidão se aglomeraria e você seria levada de maca... Muito mais que um galo.
Mas eu me contive. E estou feliz porque eu me contive. No momento tive um mini-momento de não saber oque fazer.
A mãe dela disse:
-Ia ser mais que só um galo. Rindo.
Eu também estava rindo.
Falei:
Pois é... Rindo,  de maneira apreensiva. E a garota, começou a imaginar que o seu galo cresceria a ponto de servir como uma escada, e falou que plantaria bananeira para poder entrar em casa, só com o galo dela, pois ele ficaria tão imenso que chegaria no decimo segundo andar.
O mundo é muito cruel para as crianças, olhe essa imaginação.
Saí do elevador, não antes de escutar o final da teoria dela sobre o galo gigante. Ao fechar a porta, respirei fundo e pensei:

Por isso não quero ter filhos.

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