domingo, 9 de outubro de 2016

A grande burrada feat. Clandestinidade


Sábado, 8 de outubro de 2016. Estava eu em casa, sozinha, cansada de estudar coisas desnecessariamente importantes. Precisava comprar minha passagem de ônibus para ir à linda selva de concreto que é São Paulo, e pensei: Por que não agora? A questão era: No meu armário havia um cofre cheio de moedas. Hoje, ainda havia o cofre, acabaram as moedas. Minto, tinha uma quantidade ínfima, contada, a quantidade necessária para, creio eu, duas passagens. Moedas de cinco e dez centavos, ou seja, enchi os bolsos. Eu, como pessoa esquecida que sou, esqueci onde fora o último lugar em que pus minhas chaves. ( Aqui em casa todos dormem MUITO CEDO, vulgo nove horas da noite), precisava saber onde estava a porra da chave. Como sempre faço quando estou sem paciência, pedi a meu pai a chave dele emprestada. A chave, literalmente, sem chaveiro nenhum, nua e crua.  E assim fui, desci, fiquei uns vinte minutos esperando o ônibus, famoso 474 conhecido por transportar unanimes figurar de viciados em crack e tudo mais. Maravilha, tinha ar condicionado. Fiquei em pé durante cerca de quinze minutos catando moedas. No meio das moedas estava a chave do meu pai. Coloquei a chave em cima da mao direita e fui catando moedas com a esquerda. Em meio a caos, sacudidelas e balanços, ( e um monte de gente subindo, eu tendo que desviar de pessoas ) , eu me desconcentrei e fiz uma burrada.  Das grandes. Ok, quando se está sem dinheiro é grande. E não percebi, entrei feliz e pimpona pelo corredor estreito do ônibus. Sentara uma linda criança ao meu lado, e todos sabem meu sentimento em relação a elas. Infantes tem esse cheiro particular de algo adocicado misturado com um odor parecido com urina, um cheiro muito característico de criança, úmido, enjoativo. E eu tranquila, lendo meu livro, finalmente poderia ler algumas páginas, estava enrolando há dias. A garotinha ao meu lado, deveria ter uns seis anos, meio gordinha e com o cabelo pintado de loiro. Digo que é pintado, pois ela começou a cochilar e reclinar a cabeça, via suas raízes escuras. Fiquei com pena da menina, queria cutuca-la e dizer que ela podia deitar sobre o meu colo, se quisesse. Mas ela ia pensar que eu era uma tia pedófila e estranha, deixei pra lá. Quando chegou ao ponto em que eu deveria saltar, o motorista passou direto. Começamos a subir um viaduto, e eu pensando: Para onde estão me levando? *Xingamentos internos*. Começava a tentar identificar a paisagem, e não sabia mais onde estava. Tentei me lembrar de qual era o ponto final do ônibus, e era uma comunidade deveras longe. Eu, então, fiz o mais prudente: Desci quando tinha me dado conta que estava indo para um lugar indesejado. Descemos eu, um cara e uma mulher. Perguntei a eles, na maior inocência do mundo:
-A rodoviária já passou?
Quem respondeu foi o cara:
-Passou, há muito tempo.
E eu, perplexa e ligeiramente desesperada (passagem contada), rebati:
-E como eu volto pra lá?
-Pode ir andando reto.
Como boa insegura, fui perguntar a mais estranhos qual seria o melhor caminho. Eles praticamente disseram que eu seria roubada, estuprada e esfaqueada se fosse a pé. Contra fatos não há argumentos, mas eu não tinha dinheiro comigo, como procederia? Fui para o outro lado da rua e presenciei uma briga entre um casal, a mulher gritando coisas como:
-NÃO ENCOSTE EM MIM!
E o homem andando rápido atrás dela, até que eles pararam, discutiram sobre algo que eu não ouvi, deram a volta, a mulher gritou algo e começou a andar bem rápido, o cara quase correu atrás dela, e eu só vendo, no meu canto, ao lado do ponto de ônibus. Coisas que você só assiste nas redondezas da Novo Rio.
Achei um ônibus com o nome da rodoviária na frente, subi e comecei com a adulação de só quem é ferrado na vida sabe fazer:
-Oii, com licençaaa, me disseram que é perigooooso lá na frente, teem como eu ficar aqui só para passar esse trecho? Quero ir para a rodoviária e tal... *Mais comentários acerca da minha situação*, o motorista mal prestou atenção, só concordou com a cabeça e respondeu:
-Pegar uma carona.
E eu murmurei algo como: Pois é. Falei tão baixo que nem ele escutou, só fiquei lá fingindo que não existia. Quando chegou o ponto, nem tinha percebido, ele me avisou meio puto da vida, mas foi de graça então fiquei feliz.
Desci, comprei meu bilhete... Fiquei deveras chateada quando a mulher me explicou o porque da passagem de volta é mais barata: A tarifa do Rio de Janeiro é uma das mais caras. Grandes merdas a cidade, só porque tem uma montanha com estátua, um teleférico e praia, é mais cara.
Voltando, perguntei onde pegava o ônibus para Copacabana. Me falaram que tinha que cruzar todo o pavilhão e a rodoviária, era do outro lado. Assim o fiz, e fui procurando a droga do terminal de ônibus. Perguntei, não achava, as pessoas me respondiam de má vontade, resolvi pouco me lixar também. Comecei a seguir minha própria rota e me deparei com o VLT. ( Veículo Leve sobre trilhos, mais conhecido como veículo Lesma e Tartaruga, veículo lento e tortuoso, entre outros). Via seus trilhos, brancos, lisos, e pensei: Vou andar por essas paradas.
Até que vi a estação, e que dava para entrar nela pelos trilhos, pensei: - Não é possível que seja tão fácil assim... Fui entrando pelo canto, como quem não quer nada, e pensei: - Não sei como funciona esse transporte, se pedirem o bilhete lá dentro como nos trens europeus, estou ferrada. NÃO PODE SER TAO FACIL! Fiquei na minha, lendo meu livro, em pé, longe dos transeuntes que se localizavam a alguns metros de mim. E pensando: Tem duas mulheres de amarelo me encarando o tempo todo. Mais tarde fui descobrir que elas eram fiscais. Descobri por uma ação secretíssima envolvendo habilidades mil: Estava escrito: ``FISCAL`` no casaco delas. E ficava olhando discretamente, ( na medida do possível) para os guardas, na estação, pensando em como aquilo estava sendo ridículo. Chegou o trem, entrei, na inocência, e fiquei em um segmento do vagão que estava vazio.
Foi quando eu visualizei: Ao lado das cadeiras, praticamente em todo canto havia máquinas dizendo: ``Não se esqueça de validar sua passagem!`` e eu pensei: -Ferrou. Essa porra vai apitar e falar que eu não estou pagando. Vi o policial bem mais a frente, e fiquei lendo meu livro, na maior tranquilidade do mundo por fora, morrendo por dentro. Para sair, é necessário apertar um botão. E já fui eu formulando problemas: Quando eu for sair, não vai abrir pois não validei minha passagem inexistente, eles DEVEM SER um pouco inteligentes, não é possível. Depois de muito ler meu livro, Laranja Mecânica, por sinal, valeu Isabelle, finalmente cheguei à estação. Detalhe: Era a penúltima estação, fiquei todas elas tensíssima, não passava nem uma agulha, se é que me entendem. E então, chegou o momento. Levantei, encarei as fiscais de amarelo ao longe, o policial, e fui embora. E nada aconteceu. Pude respirar novamente. Peguei o metro de maneira convencional, cheguei a casa e... SURPRESA! ONDE ESTÁ A CHAVE DO MEU PAI? E então toda essa história passa na minha cabeça, rapidamente, e eu me mando para o inferno por ser distraída e pobre. Perdi a chave do meu pai.
Moral da história: USE UM CHAVEIRO.
Moral da história dois: Pode burlar o VLT, se você apresentar uma aparência aceitável.
Moral da história três: Reforce a moral da história um. Só por precaução.


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