segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Mais pena

Comi um yakisoba
E fiquei muito feliz, realizada mesmo
Catei moedas para comer esse yakisoba
Iria escrever sobre esse yakisoba
Com muito custo consegui uns vinte reais, mais um refresco, sobrou um real
Ia botar no meu cofre e tentar recomeçar a contagem
Até que, andando pelas retas ruas de Copacabana
Em uma segunda-feira ( Dia em que recolhem lixo)
Perto das fatídicas caçambas, havia cerca de quatro garotos, remexendo o lixo
Como animais, sim, deveras triste.
Mal consegui refletir sobre como eles lembravam pobres gatos raquíticos procurando comida
Já veio um, metade do meu tamanho, parecia ter uns sete anos, me pedir dinheiro
Por um momento eu hesitei, e até pensei em recusar
Mas o que é um real? Para ele ia valer mais que para mim
Quando ele já ia embora, falei um pouco mais alto:
``-Tenho.`` E lhe entreguei as duas moedas de cinquenta centavos.
Não vi a expressão dele, se ficou feliz, conformado com sua situação, não sei.
Se ele pudesse ler isso, eu diria:
``-Desculpe.``
Desculpe por não poder ter te dado mais. Desculpe por não fazer uma mudança significativa na sua vida, por não poder te oferecer as mesmas oportunidades que eu tive. Desculpe por esse governo, que durante grandes eventos, os escondem, como se não fizessem parte dessa realidade.
Se você vai comprar comida, drogas, passagens, não me interessa. Pessoas precisam de dinheiro para viver.
Eu queria que você pudesse comer um yakisoba assim ,quando tivesse vontade.
Mas querer não é poder, não sou uma milionária solidária, sou mais uma estudante ferrada.

Desculpe. 

sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Pena


Estava eu desbravando as florestas tropicais da América Latina, Brasil, com meu equipamento próprio e ferramentas, quando uma situação me chamou a atenção. Passando por trepadeiras, arbustos, samambaias e ipês, me deparo com duas aves peculiares caminhando pelo meio das enormes árvores latifoliadas. Isso, caminhando, uma atrás da outra. Duas araras vermelhas, uma maior que a outra. De acordo com todo meu conhecimento acerca de biologia, o que estava atrás era macho, e a da frente, fêmea. O macho tinha penas verdes ao redor de um pescoço robusto, bonito de ver, enquanto a fêmea tinha cores mais brandas, atenuadas. Mas ainda assim eram duas manchas vermelhas no meio de tanto verde, e isso me chamou a atenção. Estava cansada, depois de um dia caçando pacas, entrando em rios, molhando as botas. Mas precisava parar para analisar esses dois seres tão peculiares e tão bonitos. Mas de bonito, só a aparência das aves, mesmo, pois daqui para frente as coisas ficam meio estranhas. Eu estava reparando no que os seres emplumados estavam fazendo, e acabei notando que o macho estava, não acompanhando a fêmea, mas a seguindo, quase perseguindo. Ela andando, e ele atrás, sempre, circulava uma árvore, circulava outra, e ele sempre atrás. Achei peculiar, mas só observando mesmo. Depois de andarem um pouco mais, a fêmea alça voo, para cima de uma pedra, e... O macho vai junto. Abre suas asas coloridas quase ao mesmo momento e se projeta para seguir a parceira que tanto almeja. Penas de cores variadas, amarelas, verdes e vermelhas se alteram, até que ele se põe exatamente ao lado da coitada da ave fugitiva. E é tristemente engraçado como a fêmea tenta se desvencilhar, ela tenta dar uns passinhos curtos para o lado, e está voltada com a cauda para a frente do macho, acho que eles vão querer privacidade. Mas não, ela continua tentando ir para frente, mas sem cair da pedra, como se estivesse ligeiramente incomodada, mas não totalmente aborrecida. E então, ela se vira para o macho, e fica encarando-o. Fico pensando, será que vão fazer como nas fotos, encostar os bicos? Mas não, ficam apenas se encarando, trocando mensagens somente através de suas expressões ovíparas. Ela olhando para ele, ele olhando para ela, e eu lá, sentada em uma pedra, apreciando esses lindos espécimes, queria ter uma câmera. Embora o macho esteja sendo ligeiramente evasivo com a coitada, dá uma foto legal, olhe como a natureza é perversa.
A fêmea voou, voou embora, para cima de uma árvore qualquer. O macho voou atrás, seguindo suas penas. Perdi-os de vista. Fiquei frustrada, segui meu rumo na selva.  Nunca saberei qual foi o desfecho dessa história emocionante. Espero que os passarinhos estejam bem.

PS: Para maior veracidade dos fatos, transforme as araras em pombos e a floresta na praça do metro, em Copacabana.

terça-feira, 25 de outubro de 2016

Metaescrevendo

Eu não quero.
Escrever sobre um problema que assola a sociedade no cotidiano brasileiro.
Não hoje.
Eu quero escrever sobre os mais profundos sentimentos, sobre o ódio que eu sinto, a repulsa, o amor, o carinho, esse mix de felicidade e tristeza que está sempre se renovando. Quero exprimir minhas emoções, botar para fora todo esse fluxo que vem me assolando e me fazendo refletir, eu comigo mesma.
Não quero me forçar a colocar um monte de conjunções em um texto, só para ficar mais coesivo. Dane-se a coesão, eu quero que minhas palavras toquem quem lê, e não que uma pessoa leia rápido, com pressa, e ainda enumere o que ele acha que é uma nota para meu texto! Obrigar-me a escrever um texto mecânico, utilitário, frio, é perverso. Escrevo como quem descarrega uma carga emocional muito grande em seus textos, gosta de transmitir isso, de fazer com que os outros se lembrem de que estamos todos vivos. Mas com o outro texto não, com o outro, somos máquinas, todos iguais, uns com mais erros que os outros. E ce euh comesá a ixcreve acim, vou ter menos valor como quem escreve certo? Vou ser uma pessoa melhor se eu empregar a vírgula em todos os períodos certos? Se eu desenhar um coração no fim da página, vou ser desclassificada?
Subordinar-me-ei a esse sistema. Pois quero ingressar em uma universidade. Não vai doer tanto me privar de toda minha criatividade, e escrever só mais um texto mostrando que eu aprendi e que não sou uma analfabeta. Eu escrevo, escrever me acalma, nesse contexto escrever me deixa nervosa, isso é muito ruim. A criação é totalmente repugnada, imagine que, ao invés de uma redação, fosse um poema. Iríamos achar uns muito bons, gemas no meio de vários textos, inúmeros.
Não quero escrever sobre fontes renováveis, mobilidade urbana, obesidade. Já escrevi sobre isso. Quero escrever sobre como foi meu dia, sobre como sinto saudades das coisas pequenas da vida, quero escrever sobre como um conhecido meu matou uma barata cruelmente só porque ela se aproximou dele, e eu fiquei com pena dela.
Por que não tem ninguém online para conversar comigo ás quatro da manha? Por isso fico escrevendo, eu conversando comigo, olha que reflexões legais que eu faço.

Enfim, eu vou sim fazer a tal da redação, mas não hoje. Hoje estou no clima de fazer outras coisas, de digitar coisas aleatórias, mas humanas, não estou a fim de ser máquina hoje.

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Simulação de queda

Estou caindo.
Isso mesmo , estou eu em um avião com destino a São Paulo, e estou em queda livre. Coloquei meus fones, com certo custo, estão todos gritando aqui. Se é para sentir o caos, coloco logo Dragonforce, no último volume. Então, vamos lá... Estava eu relaxada, sentada, quando as turbulências se agravaram em um ponto desesperador e só consegui ouvir pelo alto falante:
-Atenção, em detrimento do mau tempo, a turbina esquerda da aeronave queimou e a segunda está ruim. Teremos que tentar realizar um pouso forçado. Logo abaixo de nós, as grandes montanhas que separam Rio de São Paulo. Não sei onde iremos pousar, mas algo não me cheira bem. Até que avisam que a segunda turbina queimou e todos surtaram. Buzinas, luzes vermelhas, tudo vibra, tudo faz muito barulho, estou tendo um show audiovisual com elementos extras ao redor de mim, fogo nas turbinas lá fora, todos os corações dos presentes aqui cheios de pânico e terror, um pandemônio.  

Todos menos eu, olha que legal. Estou até com o cinto de segurança ainda, embora caindo a uma velocidade surpreendente. Esse texto todo equivale a um minuto de queda livre. Pessoas gritando, sacudindo os braços, estariam orando para seus respectivos deuses se pudessem ter tempo para pensar racionalmente. Queria ter um Deus para pensar: Hmmm, vou continuar existindo e vou para o céu, mas não acredito. Vou virar comida de verme, mas vou virar comida de verme com consciência livre. Eu mesma estou parecendo em transe, sentada, sentindo toda essa adrenalina percorrer o meu corpo, como se eu estivesse em um daqueles brinquedos de parque de diversão, aqueles que você cai e no final tem uma inclinação e nada acontece. Pois é, estou sentindo isso, mas dessa vez é para valer. Dessa vez não vai haver a recuperação do folego, é um tiro certeiro para a morte, eu despencando para sempre. Pego meu celular, mãos tremulas, e tento mandar a coisa mais plausível que consigo pensar em meio a tanto barulho, tantas coisas acontecendo ao mesmo tempo, digito rapidamente, para minha mãe: Te amo. Obrigada p. tudo. Droga, não deveria ter mandado isso, ela vai chorar muito. E nem sei se o sinal está pegando, eu deixei o telefone ligado e com internet durante o voo, contrariando as normas. Grande maravilha, estamos caindo de qualquer jeito. Olho para o lado e vejo uma família se abraçando, juntos como pinguins em uma nevasca. Tento pensar sobre minha vida, e não consigo enxerga-la na frente dos meus olhos, como já foi dito. Estou pensando em como gostaria de ter me despedido de certas pessoas, e de como algumas nem vão sentir minha falta.  Pensando nas últimas coisas que fiz, embrulhei minhas malas, dei um beijo de despedida em meu ex-amante, e penso... Vivi bem. Não vivi para, não sei, passar em uma prova, ou ter dinheiro. Vivi para me divertir, para aproveitar algo da minha insignificância, desfrutar dos pequenos ( e grandes) prazeres, fazer os outros felizes. Fiz ações boas, deixei uns desenhos para mais de uma dúzia de pessoas, estou feliz, não falta nada. Uma hora o bico desse avião vai encostar-se ao chão, e eu vou ser pedacinhos voando pelo ar. Deleitante, morrer como os Mamonas morreram.  Vou ter minhas partículas e a de umas cem pessoas espalhadas por aí como sementes, comida para os vermes... Que honra, que honra. As árvores se aproximando, o verde surgindo como um borrão, as enfermeiras tirando os sapatos... Tirando os sapatos? Que diabos? Enfim, continuando, não sei se gostaria de ter um revólver, agora, em minhas mãos, para poder tirar o poder desse mundo cruel de me matar. Parece que tudo passa em câmera lenta, haja ansiedade. Vivi em detrimento de mim mesma, fiz uns agrados ali e aqui, ninguém vai se lembrar de mim, mas vai aparecer minha foto no noticiário. Espero que peguem uma foto bonita. Sorrindo. Minha vida não era flores, nem um pouco. Sempre que alguém morre, parece que a vida dela era uma coisa espetacular, pois bem, a minha era bem medíocre, se existisse pós-morte eu só sentiria falta de algumas coisas, essas que foram construídas com afeto, que me cativaram. Ó, meus amigos, não chorem por mim, estou bem do jeito que estou, era para isso acontecer. Tragédias acontecem, vamos todos seguir em fren

sábado, 15 de outubro de 2016

Heliofobia

Talvez
Seja difícil para mim dormir á noite
Por medo de ter de encarar o gigante amarelo
Ao chegar a alvorada
Ou 
Por receio de abandonar a Lua, e as milhares de estrelas
Cobertas pela poluição, tadinhas
Tenho medo do dia 
Medo de sorrisos barulhentos
Medo dos raios que rasgam minhas retinas
Que queimam meu couro cabeludo
Alvo, parcialmente protegido pelos cabelos.
Sou frágil, sou noturna
Não consigo lidar com essa iluminação
Que ferve minha epiderme
Que esquenta meu sangue
Que aumenta minha pressão
Que me faz suar
Que me faz pensar
Que eu não pertenço a esse mundo diurno
Cheio de rostos iluminados, olhares determinados.
Passou a época em que eu pulava por aí, sobre grama ou areia.
Até mesmo o mar, agora o vejo como um parente distante
Perdi o contato com ele, mas as boas lembranças prevalecem.
Fico enclausurada, cortina fechada.
Quando chega a noite, a lua vem de supetão 
Me banha com esse halo alvo 
Me deixa feliz
Por esses e outros motivos
Quando todos estão indo dormir
Estou acordando.
Quando todos estão sonhando
Estou escrevendo
Em frente ao meu computador
Luz não natural terrível que fere minha visão
Embaça o que tenho de enxergar, mesmo com o brilho no mínimo.
Não vale a pena
Me arriscar a sair sob o sol de quarenta graus
Ter a pele queimada, tostada, fritada, sem piedade.
Fico no escuro, na sombra, nos lugares imperceptíveis.

A madrugada me acolhe, e aqui estou eu, escrevendo aleatoriedades... E a prova da UERJ é daqui a praticamente cinco horas. Um beijo dos falsos inteligentes 

Leia uma história para mim

Para ouvir ao som de: https://www.youtube.com/watch?v=cpzzZOi7a0s
Eu queria escutar uma história hoje, para dormir. Não tenho sete anos, mas dez anos a mais. Apenas. Não acho que escutar histórias seja ultrapassado e deva proceder somente com crianças. Se você tiver filhos, no futuro, não hesite em contar histórias para eles. Deixa-los deitados, embalados, atentos ás suas aventuras. Narre de maneira gentil, legível, e sempre com muita expressão. Digo isso, pois meus pais preferiam me dar os livros, eu os folheava, me virava. Mas cá estou, muitos anos depois, carente de alguém que afague meus cabelos e conte uma história. Não quero uma história que já aconteceu, uma cópia, não. Quero algo original, do profundo da mente da pessoa, ou até a mais tosca das crônicas, um acontecimento da vida, uma experiência, algo novo. A voz humana acalma e embala, seus tons se igualam com as batidas do coração, pelo menos comigo, e me sinto em paz. Quero compartilhar também minhas histórias, e todo meu repertório da vida. Enquanto algumas coisas que eu escrevo passam a noção de divertimento e descontração, esse aqui pretende passar outra coisa. Um sentimento de melancolia mas... não consigo descrever assim. Imagine-se em uma noite fria, chove lá fora, e você esquenta leite em uma chaleira. Pega um copo, se serve, e quando bebe, a quentura do líquido te inunda, te preenche, uma candidez extrema e sentimento de paz. É isso, eu quero que você leia e sinta isso, essa sou eu te contando uma história sobre nada. Sou eu te dizendo como uma história antes de dormir pode fazer com que a criatividade de alguém voe alto. Não sou muito exigente, sabe, gosto de histórias tanto simples, narrativas curtas sem muitos detalhes e floreios, a contos épicos em que até o sabor do alimento que o amigo do servente estava comendo é descrito, com precisão. Eu quero explorar o imaginário, quero uma relação mais forte que apenas palavras curtas, sentimentos utilitários. Êxtase e nervosismo são presentes na vida, mas agora é somente a calma. Pense bem nas personagens, no cenário, ou então só fale. Fale e me deixe embarcar no tom da sua voz, me deixe fechar os olhos, parar de encarar essa tela branca que tanto me arde os olhos, me liberte dessa prisão cibernética, de uma vez por todas... E é isso, minhas pequenas palavras madrugada adentro, quatro da manhã e quase ninguém disponível para saciar minha fome de diálogos, os faço eu e eu, então. Não tenho mais o que falar. Escrevam mais histórias. Me mandem. Boa noite.


domingo, 9 de outubro de 2016

A grande burrada feat. Clandestinidade


Sábado, 8 de outubro de 2016. Estava eu em casa, sozinha, cansada de estudar coisas desnecessariamente importantes. Precisava comprar minha passagem de ônibus para ir à linda selva de concreto que é São Paulo, e pensei: Por que não agora? A questão era: No meu armário havia um cofre cheio de moedas. Hoje, ainda havia o cofre, acabaram as moedas. Minto, tinha uma quantidade ínfima, contada, a quantidade necessária para, creio eu, duas passagens. Moedas de cinco e dez centavos, ou seja, enchi os bolsos. Eu, como pessoa esquecida que sou, esqueci onde fora o último lugar em que pus minhas chaves. ( Aqui em casa todos dormem MUITO CEDO, vulgo nove horas da noite), precisava saber onde estava a porra da chave. Como sempre faço quando estou sem paciência, pedi a meu pai a chave dele emprestada. A chave, literalmente, sem chaveiro nenhum, nua e crua.  E assim fui, desci, fiquei uns vinte minutos esperando o ônibus, famoso 474 conhecido por transportar unanimes figurar de viciados em crack e tudo mais. Maravilha, tinha ar condicionado. Fiquei em pé durante cerca de quinze minutos catando moedas. No meio das moedas estava a chave do meu pai. Coloquei a chave em cima da mao direita e fui catando moedas com a esquerda. Em meio a caos, sacudidelas e balanços, ( e um monte de gente subindo, eu tendo que desviar de pessoas ) , eu me desconcentrei e fiz uma burrada.  Das grandes. Ok, quando se está sem dinheiro é grande. E não percebi, entrei feliz e pimpona pelo corredor estreito do ônibus. Sentara uma linda criança ao meu lado, e todos sabem meu sentimento em relação a elas. Infantes tem esse cheiro particular de algo adocicado misturado com um odor parecido com urina, um cheiro muito característico de criança, úmido, enjoativo. E eu tranquila, lendo meu livro, finalmente poderia ler algumas páginas, estava enrolando há dias. A garotinha ao meu lado, deveria ter uns seis anos, meio gordinha e com o cabelo pintado de loiro. Digo que é pintado, pois ela começou a cochilar e reclinar a cabeça, via suas raízes escuras. Fiquei com pena da menina, queria cutuca-la e dizer que ela podia deitar sobre o meu colo, se quisesse. Mas ela ia pensar que eu era uma tia pedófila e estranha, deixei pra lá. Quando chegou ao ponto em que eu deveria saltar, o motorista passou direto. Começamos a subir um viaduto, e eu pensando: Para onde estão me levando? *Xingamentos internos*. Começava a tentar identificar a paisagem, e não sabia mais onde estava. Tentei me lembrar de qual era o ponto final do ônibus, e era uma comunidade deveras longe. Eu, então, fiz o mais prudente: Desci quando tinha me dado conta que estava indo para um lugar indesejado. Descemos eu, um cara e uma mulher. Perguntei a eles, na maior inocência do mundo:
-A rodoviária já passou?
Quem respondeu foi o cara:
-Passou, há muito tempo.
E eu, perplexa e ligeiramente desesperada (passagem contada), rebati:
-E como eu volto pra lá?
-Pode ir andando reto.
Como boa insegura, fui perguntar a mais estranhos qual seria o melhor caminho. Eles praticamente disseram que eu seria roubada, estuprada e esfaqueada se fosse a pé. Contra fatos não há argumentos, mas eu não tinha dinheiro comigo, como procederia? Fui para o outro lado da rua e presenciei uma briga entre um casal, a mulher gritando coisas como:
-NÃO ENCOSTE EM MIM!
E o homem andando rápido atrás dela, até que eles pararam, discutiram sobre algo que eu não ouvi, deram a volta, a mulher gritou algo e começou a andar bem rápido, o cara quase correu atrás dela, e eu só vendo, no meu canto, ao lado do ponto de ônibus. Coisas que você só assiste nas redondezas da Novo Rio.
Achei um ônibus com o nome da rodoviária na frente, subi e comecei com a adulação de só quem é ferrado na vida sabe fazer:
-Oii, com licençaaa, me disseram que é perigooooso lá na frente, teem como eu ficar aqui só para passar esse trecho? Quero ir para a rodoviária e tal... *Mais comentários acerca da minha situação*, o motorista mal prestou atenção, só concordou com a cabeça e respondeu:
-Pegar uma carona.
E eu murmurei algo como: Pois é. Falei tão baixo que nem ele escutou, só fiquei lá fingindo que não existia. Quando chegou o ponto, nem tinha percebido, ele me avisou meio puto da vida, mas foi de graça então fiquei feliz.
Desci, comprei meu bilhete... Fiquei deveras chateada quando a mulher me explicou o porque da passagem de volta é mais barata: A tarifa do Rio de Janeiro é uma das mais caras. Grandes merdas a cidade, só porque tem uma montanha com estátua, um teleférico e praia, é mais cara.
Voltando, perguntei onde pegava o ônibus para Copacabana. Me falaram que tinha que cruzar todo o pavilhão e a rodoviária, era do outro lado. Assim o fiz, e fui procurando a droga do terminal de ônibus. Perguntei, não achava, as pessoas me respondiam de má vontade, resolvi pouco me lixar também. Comecei a seguir minha própria rota e me deparei com o VLT. ( Veículo Leve sobre trilhos, mais conhecido como veículo Lesma e Tartaruga, veículo lento e tortuoso, entre outros). Via seus trilhos, brancos, lisos, e pensei: Vou andar por essas paradas.
Até que vi a estação, e que dava para entrar nela pelos trilhos, pensei: - Não é possível que seja tão fácil assim... Fui entrando pelo canto, como quem não quer nada, e pensei: - Não sei como funciona esse transporte, se pedirem o bilhete lá dentro como nos trens europeus, estou ferrada. NÃO PODE SER TAO FACIL! Fiquei na minha, lendo meu livro, em pé, longe dos transeuntes que se localizavam a alguns metros de mim. E pensando: Tem duas mulheres de amarelo me encarando o tempo todo. Mais tarde fui descobrir que elas eram fiscais. Descobri por uma ação secretíssima envolvendo habilidades mil: Estava escrito: ``FISCAL`` no casaco delas. E ficava olhando discretamente, ( na medida do possível) para os guardas, na estação, pensando em como aquilo estava sendo ridículo. Chegou o trem, entrei, na inocência, e fiquei em um segmento do vagão que estava vazio.
Foi quando eu visualizei: Ao lado das cadeiras, praticamente em todo canto havia máquinas dizendo: ``Não se esqueça de validar sua passagem!`` e eu pensei: -Ferrou. Essa porra vai apitar e falar que eu não estou pagando. Vi o policial bem mais a frente, e fiquei lendo meu livro, na maior tranquilidade do mundo por fora, morrendo por dentro. Para sair, é necessário apertar um botão. E já fui eu formulando problemas: Quando eu for sair, não vai abrir pois não validei minha passagem inexistente, eles DEVEM SER um pouco inteligentes, não é possível. Depois de muito ler meu livro, Laranja Mecânica, por sinal, valeu Isabelle, finalmente cheguei à estação. Detalhe: Era a penúltima estação, fiquei todas elas tensíssima, não passava nem uma agulha, se é que me entendem. E então, chegou o momento. Levantei, encarei as fiscais de amarelo ao longe, o policial, e fui embora. E nada aconteceu. Pude respirar novamente. Peguei o metro de maneira convencional, cheguei a casa e... SURPRESA! ONDE ESTÁ A CHAVE DO MEU PAI? E então toda essa história passa na minha cabeça, rapidamente, e eu me mando para o inferno por ser distraída e pobre. Perdi a chave do meu pai.
Moral da história: USE UM CHAVEIRO.
Moral da história dois: Pode burlar o VLT, se você apresentar uma aparência aceitável.
Moral da história três: Reforce a moral da história um. Só por precaução.