sexta-feira, 25 de setembro de 2020

 Aranha

 

À sombra dum cedro imenso

Eis-me a sentir e a pensar;

Mas o que sinto não penso

E o que penso está suspenso

Como uma aranha no ar

 

No ar balouça, fremente,

Num débil fio invisível

Dessa teia intermitente

Que liga o passado ingente

Ao presente irreversível.

 

Irreversível instante

O estar aqui na paisagem

Dentro dela e já distante

— Pois o que somos durante

É de nós próprios imagem.

 

Imagem que se desdobra

Sem que a vontade a detenha

No tempo que nunca sobra.

Viver?… Criar uma obra?…

Oh, o mistério da aranha!

Carlos Queiroz

 

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