quinta-feira, 30 de setembro de 2021

objetos de pulsão libidinal

 Em Luto e Melancolia (1917), Freud atribui ao luto

um papel de desinvestimento libidinal nos objetos

de satisfação que, a partir da prova de realidade, se

mostraram ausentes. O processo não ocorre sem dor e

sofrimento, devido nossa dificuldade fundamental de

renunciar ao que nos dá prazer.

terça-feira, 28 de setembro de 2021

TCC coisas

O trabalho e obra serem dissecados, frutíferos cadaveres latentes que ativam e reativam espaços virtuais ou nao, parte da conhecida nocao de arte-vida. O trabalho de Mariana Mitic surgiu a partir de uma problematica: Como lidar com pessoas, como comunicar, como ser um objeto de escuta e percepcao geral. Segundo Oiticica, o contexto arte-vida-corpo-mundo, é o que artista se encontra imersaté mal conseguir respirar, muitas das vezes. 

Claro que podemos adentrar brevemente no que concerne confundir personartística e ofício com identidade, como tentativa de esboçar intencionalidade acerca dos corpos que sao lancados a esmo no espaço oscilante que é o que concebemos como vida, o que pulsa, que esta vivo. 

Pois bem, destas pulsões, muitas se mesclam e trazem dúvidas, uma vez que vida se confunde, em nossa realidade de infinitas possibilidades,com ruído. O ruído busca pelatençao, a cor vibrante, os decibéis mais elevados para finalmente nos depararmos com conteúdo, com corpos, falas, maquinas deleuzianas que buscam ser apreendidas, que farao as inúmeras engrenagens escondidas pelos requintados tecidos púrpura que evocam imagens a serem devoradas, acatadas, digeridas.

 a palavra ''simbolizao'' provém do grego ''symbolón, sinal de reconhecimento , aludindo a ''um objeto dividido em dois entre dois indivíduos. Cada indivíduo retinha uma metade. após uma longausencia, um deles apresentaria sua metade e, se ela correspondesse a outra metade que o indivíduo possuía, isso colocaria em evidencia um vínculo entre os dois.'  Di Cegli

Dos ideais alimentao - Nutrir-se de imagens. Projeçao 

artista propõe, entao, o olhar crítico acerca do que digerimos, o que olhamos, o que torna-se objeto de projeções do subconsciente, uma vez que o corpo, em seu ideal potencializante, muitas vezes nao consegue concretizar e proporcionar para si mecanismos de ao que busquem lidar com as pulsões, erradica-las, transmuta-las, etc. É preciso projetar, para, assim, conseguir transpassar os processos catarticos. O que se põe em jogo é o quanto essa catarse pode ser violenta, pode ser descompromissada com o objeto com o qual se dialogara.


a obra dartista tem grande referencia dartista sérvia Marinabramovic, uma vez que a mesma se utiliza deste conceito, arte-vida, para usar seucorpo e obra comoexperimentos sociais, zonas de limites em instancias que concernem até onde vai o sujeito, até onde a imagem artista de despe de sua carne , cheiros, vivencias, pensamentos e emoções e torna-se apenas mais uma imagem a ser consumida, ou entao: quais os fatores de fricçao, os pontos de tensao que abordam um inconsciente coletivo, e a tentativa da transformao do ''outro'' em rótulo estabelecido, condicionado, seguro.

O trabalho de Mariana Mitic é um surfe caótico cujos mares oscilam em tempestiva revolta e calmaria, uma vez que diz respeito o assimilar o sujeito como partes rearranjadas, logo, o próprio corpo dartista é uma colagem, assim como seu pensamento, referências.

Fases: Crises- Questionamentos acerca das instituições vigentes 

Rupturas, ou corpo sem orgaos - 

Remanejamentos e ordenações 

Silencios e contemplao, distanciamento estético








Com o quesito que habita o cerne da perturbacao do ser, artista se vê exaurida por ter elaborado para si o potencial transmutador, por diversas vezes o artista se depara com resultados diferentes de como o corpo e quais corpos impactam, por que impactam.

quarta-feira, 15 de setembro de 2021

 https://www.scielo.br/j/pcp/a/xYBLQtG6kBBCfNFRS7bnwqQ/?lang=pt

https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/mnemosine/article/view/41578/28847

https://www.proquest.com/docview/2051051005?pq-origsite=gscholar&fromopenview=true

file:///M:/Downloads/Psi%20social%20em%20experimenta%C3%A7%C3%B5es.pdf

terça-feira, 14 de setembro de 2021

Reparos

 Kintsugi: A técnica japonesa de reparo é uma lição para nós, ocidentais. Quando uma porcelana porventura se parte, repara-se com ouro, e assim é assimilada uma nova peça, a partir de uma anterior.       Como na arte, nada é realmente original, mas sim uma apreensão geral do meio e das técnicas diversas atreladas ás personalidades, o que o indivíduo faz é mesclar mais técnicas, experimentar, se expressar através de sua identidade única, e assim evocar objetos-respiros poéticos e subjetivos em materialidade. 

Nós, fragmentados pela falta de tempo para poder nos conceber como um todo, diversas máscaras que exigem que sejamos um modelo de comportamento e personificação distinta, nossa atenção dividida em processos do presente, ansiedades no futuro e melancolias do passado, o excesso de informação e estímulo que abafa nossos ouvidos, mentes, olhos,  corpos. Muitas vezes, com o excesso de labor e a venda de nossa força de trabalho surgem crises de identidade, momentos de despersonalização, ou de extrema apatia para com o meio e os que nos cercam.

 Precisamos de disposição, atenção, cuidado para com nós mesmos para que posssamos, assim como com as peças de cerâmica, costurar nossos afetos, entrelaçar sonhos, entender as esferas dos desejos reprimidos e acatá-los como partes de nós, assim como entender nossas dores, traumas, e desconfortos. Esse ''conteúdo'' pode ser arranjado e rearranjado em narrativas proveitosas para o fluir dos processos psíquicos do sujeito, uma vez que ele se põe, ás vezes com a ajuda do analista/ psicólogo , agente de sua própria narrativa, que pode questionar a forma de apreensão de memória, e assim rearranjar sua estrutura conforme lhe for aprazível.

 Mal sabemos se o pensamento que chega até nós em conversas frenéticas entre neurônios atordoados tem, em gênese, nossa intencionalidade como fim e matriz, ou se somente nos foi sugerido durante a última peça publicitária do Instagram, ou quaisquer outras ferramentas midiáticas. A questão para iniciarmos a indagação acerca do ser no mundo é: Como ''estar'' em uma sociedade em que o novo faz-se objeto de desejo, status, associação de meta a ser alcançada, enquanto corpos que naturalmente vão sendo exauridos por um sistema competitivo, acirrado, desgastante e desestimulante são descartados e/ou condenados a invisibilidade, em que suas proprias narrativas são deixadas de lado mediante produtos brilhantes, novos e interessantes? E não apenas estes corpos reificados, tornados objetos de apreciação e consumo, mas objetos, narrativas, mecanismos culturais, dentre outros.

A priori, pensemos em nós como peças, como modos de estar no mundo, não o engessamento que o verbo intransitivo '''ser'' promove, mas uma sucessão de modos, em que o mais leve oscilar positivo pode fazer a diferença em uma semana, ou em que uma crítica breve pode nos abater e tardar a partir de nosso inconsciente. Que pensemos estas peças, como em xadrez, se movem através da seta da intencionalidade de discurso Lacaniana, que consigamos entender que até o mais vil agente na narrativa peculiar de um sujeito, o tão conhecido Outro, é peça principal de seu jogo de xadrez individual. Logo, todo indivíduo passa pela suscessão de vitórias e derrotas no percurso de sua existência, e é claro, uns com ''cheats'' do jogo, outros ''nerfados '' naturalmente pela vida. 

A questão é: Todos, a partir de sua perspectiva, são bons, querem fazer o que denomina-se o bem, e talvez um dos mecanismos a serem trabalhados enquanto coletividade seja o diálogo, a conversa, a discussão acerca do que seria este ''bem'', uma vez que as mesmas podem ser as mais distintas: Assim, achando os pontos em comum, pode-se tecer uma ideia do que seria um convívio harmonioso, mesmo sabendo que, na prática, é muito mais complicado conseguir sequer baixar as barreiras de auto proteção para, então, acessar o Outro. Todos sofrem e têm cicatrizes, traumas difíceis de lidar, e é importante ressaltar o quanto essas partes precisam ser trabalhadas, que sejamos amparados e teçamos redes de afeto e diálogo para assim compartilharmos de vivências, daí a importância da arte, a expressão enquanto presença, enquanto escuta.

A competição capitalista por fundos e ascensão social e econômica é uma narrativa que esgarça, desencoraja, desestrutura, e impede muitos de alcançarem seus sonhos. É decerto um privilégio poder conceber que a vivência como seres humanos abarca muito mais que essa corrida repleta de injúrias e infortúnios: abarca conseguir auxiliar o desfavorecido em processos de socialização, implica perceber que os engessamentos e vícios humanos não se estendem á imensidão dos outros seres que aqui vivem, que a acumulação de bens para ascensão social é vazia sem as práticas culturais que lhe conferem a noção de coletivo, de pertencimento, é o experienciar diferentes vivências, narrativas, é a despedida dos que viram gerações se desenrolarem, e o abraçar e acolher os que ficarão quando nos formos.

Reparo de relações, de instrumentos, de seu próprio comportamento: ás vezes, uma peça que se desloca em movimento não pensado, acaba promovendo interpretação errônea do discurso, encerrando por ali o diálogo entre os agentes envolvidos: qual é o custo do orgulho, o custo de admitir a falha humana, o valor do despir-se da máscara infalível que foi concebida diante de um ideal cujo fim mal conseguimos distinguir? Somos tão pequenos, nosso ego e vaidade muitas vezes nos podando, nos impedindo de pedir ou aceitar um singelo pedido de desculpas.

E a procura generalizada por novas pessoas que possam escutar remanejamentos de nós mesmos para que possamos soar mais interessantes, novos produtos a serem vendidos em vitrines de aplicativos nas redes sociais, mas como assim, vendidos? A moeda é o tempo, por isso a necessidade de trocar, substituir, remanejar, antes que sintamos e percebamos que os corpos são frágeis, instáveis, incertos e... humanos, falhos. Não há porque ter culpa em sentir dor, medo, insegurança, frustração, nós sentimos, e podemos lidar com isso de diversas formas. O primeiro passo é perceber, o segundo é entender o que acontece em tais situações, quando o mecanismo é involuntariamente acionado. 

''A culpa tratada por Freud se intensifica nos tempos atuais, porque parece que tudo concorre para que o indivíduo se torne livre e feliz. O problema, portanto, só pode ser ele. Não há justifica externa para o sofrimento, embora seja a conjuntura epocal que dê a ilusão de que tudo concorre para que se torne livre e feliz, de tal modo que toda falha será sempre pessoal''. Cristiane Mattar em ''Depressão ou fenômeno epocal?"

Pensar que ainda somos perpassados por uma moral cristã que condiciona e reprime corpos, principalmente no quesito LGBTQIA+, logo, muitas vezes o processo de reencontro consigo mesmo seja rever alguns tabus enterrados nas áreas mais sombrias de sua psique, e mais uma vez, o acompanhamento de um psicólogo é extremamente benéfico para que haja, com a projeção e associação livre, um agente auxiliar-veículo para acessar não respostas, mas perguntas que deixaram-se silenciar com o tempo. 

Há muitas problemáticas acerca do ser no mundo, de precisar cumprir com uma ética que complemente e exprima para o ''mundo de fora'', o virtual, esteticamente a ideia de progresso, de bem-estar, de satisfação plena, como se estivéssemos a todo tempo fazendo campanha publicitária de nós mesmos, de nossos corpos. Pensar questões como ''Para quem me visto?'', ''Com quem converso, e o que comunico'', ou ''Para onde estou indo agindo desta forma?'' são questões que levam para dentro de si, e quando entramos em nossos espaços menos desejáveis, na solitude das madrugadas repletas de pernilongos do Rio de Janeiro, por exemplo, é quando nos deparamos com estes nós. E são nós que precisam ser analisados, pensados, talvez comunicados se lhe for proveitoso como processo, etc.

O reparo é um processo demorado, e pode ser auxiliado e direcionado com a análise, com o trabalho de um profissional da área da psicologia, uma vez que o discurso do escapismo, da necessidade de ''reiniciar o sistema'', pode levar a ansiedade generalizada, uma vez que sabe-se o motivo da angústia, mas a agonia é tamanha que não se pode chegar aos mecanismos para trabalhar as questões para combatê-la.

' A singularidade, portanto, não é dada desde sempre, mas precisa ser conquistada, ou seja, não estando pronta precisa ser formada. A ideia de formação tem como pressuposto a angústia do homem sugerindo, deste modo, uma maneira de se transformar e aprender a partir deste caráter. Da indeterminação, característica do nada da angústia, surge o ser-capaz-de, ou seja, o poder se formar. Haufniensis vai designar a Psicologia como a ciência mais apta a lidar com este espaço de angústia, com este interlúdio, uma vez que nesta área não cabe teorizações, mas a sustentação deste espaço onde "tudo é possível".

A catarse, entropia, a rapidez com que mecanismos alienantes podem fornecer válvulas de escape entorpecedoras, que vão reificando e obliterando o filtro crítico dos indivíduos, não lidam com o ponto crítico, o cerne da angústia, pelo contrário, em vez de nutrir e fazer o indivíduo percorrer os galhos e ramos de seu comportamento, busca em certos mecanismos cortar-se, podar-se, justamente para crescer novamente, o conhecido buscar remediar a consequência, desviando-se da causa.

Como reparar o outro? Primeiro, reparando a si, buscando escutar os sons de seu corpo, respeitar os próprios limites, escutar as vozes que sussurram baixo quando tomamos alguma decisão, estabelecer registros para auto assimilação e reflexão. buscar terapia, lembrando que cada cidadão, em um sistema ideal, deveria ser provido de auxílio em saúde pública no que concerne saúde mental. 

Depois, buscando apreender o entorno, tentando captar os pontos de tensão , ruptura e fricção em uma sociedade apática e angustiada, o auxílio pode ser fornecido em micro-doses: um simples puxar de conversa, um olhar de reconhecimento que afirma: vejo que você está aqui, que você existe. Uma vez que nos preocupemos com o bem-estar do outro, estabelece-se uma rede de apoio orgânica, por vezes velada, ou negada, mas que, por fim, materializa-se sobre o pretexto de que todos esses indivíduos fragilizados, tensos, ansiosos, por trás das máscaras e performatividades alheias, anseiam pelos mesmos fins: aceitação em coletivo, segurança para si e seus próximos, conforto, afeto, [ a multiplicidade de narrativas e interpretações do que nós denominamos] amor. Até mês que vem!


segunda-feira, 13 de setembro de 2021

fofas

 

 “Para ser um artista, você precisa existir em um mundo de silêncio.” louise bourgois

20 – “A arte não consiste mais em um objeto para você olhar, achar bonito, mas para uma preparação para a vida.” lygia clark


“Nunca seja limitado pela imaginação limitada de outras pessoas”-  Mae Jemison (astronauta americana).


Move Fast, Break Things

 A obra  ''Move Fast, Break Things'' concerne questões que abarcam o hiperlink, o excesso se transmutando em dados pictoricamente anexados, pensados como composição. Thiago Resende se utiliza do recurso lúdico ao fazer alusão ao Jogo Da Vida, em que os personagens, os jogadores, são pre condicionados a serem perpassados por uma série de situações:

No caso da obra de Thiago, o locutor é nada menos que a voz mecânizada do artifício Google tradutor e do GPS google maps, como o mecanismo que indica a direção para condicionar o sujeito de um ponto a outro do mapa: O operar de Thiago é justamente ressignificar a noção de sentido, através de um viés filosófico, trazendo a problemática de que o ''estar sendo'' na sociedade hoje é ser atravessado, perpassado, por diversas noções epistemológicas, até onde somos levados por narrativas alheias, até onde realmente fazemos parte do que se dá como conteúdo midiático? 

Thiago trabalha nesta zona de atrito entre o pessoal e o midiático, o cotidiano, o performativo, o virtual. Como o indivíduo se locomove por esses espaços? Além disso, o artista sugere dúvidas, crises existenciais pelo meio do percurso, conferindo o constante rompimento das regras que mal foram exibidas e clarificadas a priori, trazendo,  de forma irônica, o degradar de símbolos considerados ''virtualmente sagrados'', assim .

quarta-feira, 8 de setembro de 2021

texto acerca da obra de Gabriel França

 Um presente, oferta, um mimo a existência. Pedra fundadora da consciência e existência, marco zero de uma cosmogonia da poética de Gabriel Caetano: Sua poética tem mapa, tem raízes que se direcionam a espaços, corpos-objeto que fazem-se sujeitos e marcam sua própria trajetória: 

O trabalho visa estabelecer uma analogia com o corpo humano, em que o espaço desprovido de matéria, o quadrado claramente talhado por mão humana em uma mesa em Juiz de Fora, recebe o contato de outro corpo como diálogo, uma Pedra, apanhada por entre as andanças do artista. Ao estabelecer espécie de jogo-ritual de preenchimento de quebra-cabeças, Gabriel Caetano busca não completar ou ressignificar, mas agraciar, cumprimentar os materiais, que a matéria orgânica que se matrializa na forma de musgo se comunique com o corpo, este outro, que é inserido.

Assim, Gabriel Caetano tece mais um conceito muito bem pontuado em sua pesquisa e obra, o de conectar subjetividades, através da projeção afetiva e sensorial. O contato entre os dois corpos, mesa ( instância de recepção, corpo-objeto-receptáculo) não necessitaria efetivamente englobar e tomar posse do tijolo em questão, o corpo-inserção-outro , uma vez que sua proposta é justamente a conversa, a assimilação e o abraço entre os seres , cada um atribuído a sua respectiva aura simbólica afetiva. 

Pode-se estabelecer analogia com a forma dos seres humanos de se relacionar com o que lhes cerca, uma proposta de relação em que percebemos o fenômeno de transpassar afetivamente o ser, sem prejudicar ou invisibilizar sua identidade própria, mas, por mais que tenhamos cores formatos, que os encaixes não sejam precisos, como pode-se ver a partir dos registros fotográficos, consigamos estabelecer a conexão primordial, a aceitação, o fugaz sopro de alívio, o olhar gratificante no final do dia, reconhecer o outro como instância legitimadora, e em vez de apontar as inúmeras diferenças, olhar para dentro da matéria e perceber que somos o eterno retorno ao útero afofado em que germinam e perecem seres. 

Assim é Bloquinho de Terra no Quadradinho: Um retorno a terra fofa, um passeio não linear cujas arestas foram aparadas, uma conversa silenciosa, o registro, tão efêmero quanto o bater de asas da borboleta, a quem lhe interessa a inserção deste corpo frágil, diminuto, a ser envolvido e abraçado pela instância maior, uma vez que, ao passar, o espectador mal poderia vislumbrar o corpo ali, envolvido, englobado, protegido pela matéria que lhe é análoga em seu cerne? 

Talvez seja sobre a não necessidade do monumento extra-ordinário que se equipara e compara com aranha céus, através de um gozo narcísico e a batalha pelo ''Mais'', mas a documentação e o processo como o momento de abraço, de contato de mãos, constituídas por minérios, cálcio, carbono, água. Gabriel Caetano propõe uma dança leve, um ritual de agradecimento ao anti-monumento, a intervenção que visa ao aconchego, ao carinho, ao cuidado, e não a dominação e controle de territórios.

Gabriel Caetano visa agraciar e contemplar a natureza em cerimonia ritualística, para estabelecer, poeticamente, uma meta-viagem no tempo, em que as cicatrizes, marcas e histórias de um corpo vibrem e façam ressoar nas estruturas do outro. Que os musgos transitem entre os corpos e, assim como o Artista, intervenham e brinquem, estimulem e agraciem o local com suas cores e cheiros.


quarta-feira, 1 de setembro de 2021

Uma pedra no meio do caminho

 Acorde. Não o musical, mas acorde. A proposta do trabalho de Gabriel França é estalar os dedos timidamente a frente do interior do apreensor, de quem se depara com o trabalho. É o pedregulho que faz reverberar ondas no lago, é o impulso subjetivo atravessando quem escuta, e quem se depara com a Instalação Sonora em seus locais mais inusitados. 

E há quem se pergunte, ''De onde está vindo o som?'', este é o enigma, de certo grau cômico, faz o olhar se deslocar para locais distintos, o local em que o indivíduo imaginaria estar esta pedra, quem sabe a sua frente, ou trás? Apenas a suposição do local onde a pedra estaria, é um processo que evoca imaginação, que suscita um cenário, uma atmosfera que ressalta o ambiente a sua volta.

Há uma pedra no meio do caminho. Há uma crise entre nós, um momento de ressurgir, de reconstruir, a partir da mínima oscilação e alteração do fluxo de consciência que se passava por praças, saguões e espaços públicos, suscitando indagações: o quão inusitado seria uma pedra que fala de si? Busca-se o artifício da norma ''arte-contemporaneizante'' de que algo precisa ser complexo, difícil, elaborado com vários recortes e camadas, e o público se depara com este corpo natural, cirurgicamente tratado, mas tão minuciosamente trabalhado que mal se percebem as cicatrizes de outrora.

Quem diria que a célebre frase do poema de Carlos Drummond de Andrade seria apropriada na obra do artista visual Gabriel França, como as palavras do escritor constituem o portão-portal que introduz o mergulhar em sua poética. Há uma pedra no meio do caminho, há flores nas calçadas que adentram os bosques na obra de Gabriel França, e elas são dispostas nas frestas, nas sombras, para que o sujeito despercebido não pise-nas.

No meio das certezas que perpassam mentes exauridas, muitas das quais dispostas em frios e apáticos depósitos, lhe vem um sussurrar por via sonora, uma dúvida, em tempos de tantos pontos finais, uma vírgula. Se as retinas quedam-se demasiadamente fatigadas, Gabriel Caetano propõe o sopro da indagação como uma onda no mar quebra, que os ouvidos apreendam o que os olhos negam fazê-lo.

O visual e o sonoro se mesclam em dança poética que orbita natureza, silêncios, percussos, dúvidas e corpos. Uma ativação sonora no espaço, o ''ser'' em ''estar'', sem necessitar da justificativa de fazê-lo. Nos portamos, tão pequenos, em nosso microcosmo bolha-rede social, olhando para o caminho e esperando não nos depararmos com opiniões adversas, pontos fora da curva, raciocínios não lineares, dentre outros.

A obra de Gabriel França é necessária, propondo as inúmeras performances do corpo de quem encarna o sujeito que se depara com o objeto, mas sua obra esconde o oposto: O sujeito é a pedra. Pelo ponto de vista da Pedra, nós somos o objeto, e este cenário é frutífero para inúmeras interpretações, ''Tinha um sujeito olhando para todos os cantos deste espaço em que me encontro, me procurando''.

Que a pedra, este território estranho, lembre que sempre hemos de passar pelo desconhecido, que muitas vezes o desconhecido desperta o adormecido no indivíduo, que este momento de crise, pode ser a quebra de um padrão de comportamento. Que a pedra pode ser, como na poética de Caetano, fragmento de natureza que, por entre as moléculas de carbono, seja o mesmo constituinte que o corpo que realizou sua cirurgia, que o corpo que escutou sua voz escondida, que o corpo que aqui se encontra escrevendo.

O trabalho de Gabriel Caetano visa estabelecer uma apreensão menos arbitrária ou parcial da Pedra em si, mas do questionar tudo que está em seu entorno, a pedra é apenas a materialização do Outro. E se a Pedra for uma questão do indivíduo consigo mesmo? E se a pedra fosse a projeção da frustração, por que não poderia também ser a projeção da mudança? Por que não atravessar este corpo-instalação como o rio faz com as pedras, envolve-nas, abraça-as, e flui.