Gozar não no sentido sexual, sabe o que significa "gozar", em sua origem?
- transitivo direto, transitivo indireto e pronominalpossuir ou utilizar (algo prazeroso, salutar, útil); desfrutar, aproveitar(-se)."g. as férias"
- 2.transitivo direto e transitivo indiretodeliciar-se, deleitar-se com."conversa durante horas com o velho, gozando (de) sua boa prosa"
Aproveitar. Do que? da vida. Desfrutar o gozo como estado de bem-estar pleno, de emissão de serotonina, ocitocina, e vários outros hormônios que nos fazem querer fazer coisas, traçar planos, se relacionar com pessoas, queremos nos sentir bem.
Qual o questionamento? Bom, estamos tão imersos em um cenário em que *não estamos nos sentindo bem*, que estamos buscando por formas desesperadas de tentar *gozar*. E isso desemboca em um consumir voraz, de características capitalistas, no que concerne simplificar tudo ao seu redor em produtos, disponíveis ou não.
Objetificar corpos, mentes, subjetividades, atos, gestos. Através de uma performance do relacionar exaltada pela mídia, não se conhecem outras formas para *gozar* do corpo do outro, do espaço em que está, se não a forma objetiva, maquinada, rápida, certeira, objetivos atrás de objetivos, não lhe é permitido gozar, porque o homem já está preocupado com o próximo momento.
Sabendo disso, é preciso apontar uma problemática que está cada vez mais em voga: o repúdio e o combate a corpos gozantes. O ponto LGBTQ+ é muito interessante, uma vez que o homem incluído nos padrões usuais ( hétero, branco, cis) é o ponto de maior circulação do pensamento objetificante, uma vez que o mesmo não se propõe a pensar sobre a questão de seu recalque, de seu pavor interior, o de ser retirado o protagonismo, de ser deixado de lado. "A pior coisa para um homem não é ser odiado, é ser ignorado pelos seus, pois assim ele passa por uma dissociação de personalidade."
Eis-se o pensamento: "Como poderia eu, enxergar uma mulher que, de acordo com minha concepção de mundo, está aqui para ser consumida por mim e pelos meus ( que são uma extensão de mim), pode estar se relacionando com outra mulher? Como um produto, que deveria estar disposto para meu bem-estar, para me entreter, com suas belas formas, cabelos longos ao vento e maquiagem, pode estar se desperdiçando, eu como predador a busca de cada vez mais corpos, enxergo nessa mulher não mais uma mulher, mas um competidor. Nem consigo enxerga-la mais como mulher, a vejo como homem: como ela, não tendo um pênis, pode adquirir mais corpos-produtos que eu? isso significa que... o pênis não é a garantia de transmitir prazer? esse monstro pode conferir mais prazer, mais virilidade, mais eficiência que eu, justo eu, que sempre acreditei ser o mais assertivo possível?
Esse homem, que sempre se esquivou, sempre evitou olhar para corpos que não estejam dispostos como quitutes abertos a degustação para seu prazer próprio, que, vejamos, de volta ao gozo. Que prazer é esse? É um prazer sádico. Porque o prazer sexual não é cumprido, uma vez que se relaciona com um corpo do gênero oposto como se estivesse se masturbando, sem se preocupar com o gozo do outro, simplesmente buscando consumir, saciar, o momento de satisfação dura menos de três segundos, quando ejacula, e depois volta ao buraco negro de insatisfação. Querendo esse micro-prazer, atrela-se a um relacionamento, e assim bota o braço ao redor de sua parceira-objeto, dando olhares nervosos e agressivos a homens e mulheres que sequer pensam em desestabilizar a relação. O gozo do homem é a ostentação, é mostrar que cresce na escala social de poder, "eu tenho um corpo, tenho um objeto lindo só para meu benefício", o gozo é muito mais social que sexual. E isso se dá nos comentários para seus amigos, em que comenta sobre seu desempenho, sua virilidade, sua performance. Performances encantam outras performances, e é esse o gozo do homem insatisfeito sexualmente, que mal conhece seu corpo, se não seu pênis, tem horrores de tentar explorar outras áreas erógenas, tudo pode ser um sinal de fraqueza, um sinal de que se é menos homem.
Assim, o homem se sente violentamente atacado quando vê um casal do mesmo sexo, homens e mulheres trans, e afins. Em vez de estabelecer um questionamento profundo e denso acerca de seus valores, ( não é isso que o capitalismo prega, não é mesmo? é muito mais benéfico que ele seja uma bomba relógio compulsiva agressiva, se todos fizessem seus questionamentos diários, buscassem ajuda, não teria notícias na TV, nada como banir filosofia das escolas), ele simplesmente parte para o apagamento do discurso do outro. Discurso esse não verbal, discurso como "esses corpos estão exprimindo algo". E o que estão exprimindo? Gozo. Gozo real, gozo de uma convivência pacífica, sem hierarquias abusivas, satisfação sexual mútua, relacionamentos desprovidos de ciúmes tóxicos, ou então, quando é só um corpo, a mesma situação: uma pessoa que está desfrutando de sua solitude, fora dos padrões midiáticos do pensamento coletivo de massa, satisfeita consigo mesmx, é uma afronta a um pensamento dicotômico que implica que 1) você é obrigado a ter um par, 2) se você está só, está no nível mais baixo da escala social, porque seu valor aquisitivo baixa, "ninguém quer ficar com você", dentre outros.
Essas pessoas gozam ao andar, ao respirar, elas não tem a pressão de tentar ser quem elas não são, não são egoístas, falocêntricas e paranoicas. O homem-padrão-normativo sente, internalizado em suas vísceras, inveja desses corpos. Queria ele poder dizer seus medos, arriscar-se a outros horizontes, outras conversas, mas ele mesmo se constituiu de tantas amarras que já se encontra perdido em um mar de masculinidade tóxica, e parte para a agressão física. Quer interromper o gozo fluido desses corpos, se eu não gozo, ninguém mais goza. É quase como se ele estabelecesse um vínculo com os outros, em que esses outros não estão nem aí.
É um desespero para ser visto, ser notado, ser escutado. É o ato final do seu espetáculo de fantoches dizendo: "eu ainda existo, e eu quero ser protagonista de tudo, mesmo quando não estou inserido, e farei QUALQUER COISA para obter isso." Há muito tempo chamam as mulheres de histéricas, de agirem por paixão, mas tem coisa mais patológica que MATAR por sentimentos feridos? Escutem sertanejos universitários, há coisa mais estúpida que xingar e difamar a mulher a partir de sua rejeição? A "histeria" feminina era algo classificado como implosivo, algo que corroía a mulher por dentro, e mexia com o papel patriarcal do homem, era o grito mediante o silêncio perante a qual as mulheres precisavam permanecer.
Pense você, se você não pudesse entrar em universidades, se vestir do jeito que quer, se relacionar com quantas pessoas quiser, exprimir suas opiniões, fazer e mostrar sua arte, gerenciar negócios, empresas, dirigir, votar, POR MAIS DE 1500 ANOS? Você estaria respondendo bem em seu lar familiar, ao seu marido, uma vez que no século dezenove surge a concepção de indivíduo, da grande ascensão da filosofia, e as mulheres mal vistas como indivíduos, infantilizadas?
É aí que chego e trago minha tese de TCC: A Histeria Masculina, o gozo, o sadismo, e suas consequências. O homem vem apresentando, desde sempre, suas guerras sanguinárias sem sentido, seus conflitos territorialistas desprovidos de diálogo, sua emoção que toma conta do rosto ( e do pênis) e o faz querer dizimar de forma animalesca quem se enfie no caminho. A questão é: o homem precisa aprender a domar seu instinto, pois vivemos em um mundo de oito bilhões de pessoas, e o Brasil é o país que mais mata mulheres, negros, LGBTQ+ do mundo. Como lidar com essas questões, como desconstruir a masculinidade tóxica sem que nossos corpos também sejam levados com a maré de sangue que o fascismo vem impregnando no nosso território, em 2019? Como apresentar argumentos e ações em um cenário em que o PRÓPRIO DISCURSO vem sofrendo apagamento? Como? Como entender que não é um embate de gêneros, mas uma tentativa de equilibrar um cenário que sempre pôs o padrão como certo, e os demais como periféricos, sem que o faça de forma a instigar a violência no corpo do homem, tão frágil, e tão querendo-se-convencer que não é frágil? Como apresentar esse diálogo em cenários não universitários, fora das bolhas de convívio, tentando fazer uma pequena diferença saudável em um mundo com câncer?
Se alguém tiver ideias, comentem sobre, é pro meu TCC. grata
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