é muito fácil "estragar" uma criança, nem sei se cabe o termo "estragar", não sei até onde vai o trauma. Que nossas terapias e psicologias sejam capazes de lidar com tanta gente machucada.
A criança é uma folha em branco sem vícios, que preza pelo prazer, interessada em absolutamente tudo; aí que está a questão, por ser interessada em tudo, é bizarramente influenciável, e sempre vai ser, por começar sendo uma folha em branco. O que acontece, é que pais tóxicos podem criar filhos traumatizados que, para se afirmar como indivíduos, precisam se opor a o que os pais foram, de forma radical, e, assim, restringindo-se a limites que tocam nessas feridas.
A falta de válvulas de escape saudáveis em uma sociedade condensada, superpopulada, faz com que essas "fontes de energia nova" sejam utilizadas como vórtices de atenção e de despejo de fracassos e inseguranças existentes. Cobranças e reprimendas vão, aos poucos, matando a criança interior, que se fecha a subjetividades e afetos, contribuindo para a maquinização da humanidade, o algoritmo da apatia, da ausência do tato familiar.
Na ausência do tato, comentários cada vez mais destrutivos, comparação com irmãos, primos, amigos, podem incutir no subconsciente da criança o sistema de mais-valia comportamental; esse pensamento, se não trabalhado, como uma erva daninha, pode crescer e impedir que a "vegetação natural" cresça e floresça, pois toda a perspectiva de sucesso, gratificação social, financeira, política, vai ser baseada em comparação, e a atenção vai ser desviada do momento atual para a projeção de uma eterna grama do vizinho que é eternamente posta em conflito. Assim, promove-se uma política de micro-violência e competição, dificultando o processo de fazer amigos, visto que o seu semelhante é um adversário.
O vital em analisar esse distúrbio, é que no processo comparativo ocorra a baixa na autoestima do indivíduo, sentimentos de impotência que são reafirmados a cada vez que a família repreende suas falhas e deixa de elogiar seus êxitos. O individuo passa então a uma atmosfera afetada, em ideal errôneo de, como vórtice do negativismo de um lar, ele seria o causador de um "mal", e que não é capaz de fazer nada corretamente, quando na realidade apenas foi condicionado a uma série de estímulos negativos que lhe extraem o impulso criativo, intelectual, empreendedor, que lhe extraem a "energia inesgotável" dos jovens.
Como isso aplica praticamente na sociedade? funcionários desmotivados, acostumados a condições terríveis no trabalho, jovens receosos que abrem mão de seus sonhos, pessoas que se encerram afetivamente e são rodeadas de bloqueios e fobias sociais. E agora vem a tia de quarenta anos e diz: -Tem mais é que botar ele/a na terapia.
Terapia não refaz autoestima. Não dá ideias, não modifica o meio, não lhe dá energia nem apaga as memórias do passado, principalmente quando é uma saída de emergência da família para quando a situação tenha ficado crítica, a pessoa não conseguindo mais levantar da cama, por exemplo. Não é um profissional que vai reatar e quebrar o algoritmo da apatia e conseguir fazer que os núcleos familiares passem a se comportar de forma mais benéfica e reparadora, em vez de comparativa e tóxica.
Quem refaz e muda tudo isso é você. E dói. E é difícil. E, ao contrário do couching, vou dizer: tem gente que não é capaz, e se deixa levar. E dói muito mais. Então, se for pra doer, que doa tentando, e quando se tenta, cada dia dói cada vez menos. Pela aceitação, pela conversa, pelo diálogo, pela não-violência verbal e física, em tempos de crise, é nos lares e nos círculos afetivos que precisamos nos cuidar, nos escutar.
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