Dois e quatro. Quatro e seis. Seis e um. E assim ia. Minhas
tardes, depois da escola, fins de semanas desocupados. Eu jogando com meu pai.
Tinha sete anos apenas, todo um mundo a ser explorado ainda. O jogo era tao
simples, só colocar as pecinhas uma atrás da outra, comprar, ficar com uma
quantidade enorme. Várias reviravoltas. Eu realmente me divertia á vera. E meu
pai se sentia presente, um pai incrível gastando algumas horas de seu dia para brincar
com a filha. Nós sentávamos de pernas cruzadas, no chão mesmo, e era legal. Eu
chegava e pedia a ele para jogarmos dominó. Sempre fui muito competitiva,
vibrava quando ganhava e clamava por vingança quando perdia.
Até que um dia eu
cansei. Da mesma brincadeira, dos mesmos hábitos. Perguntava a meu pai se havia
algo para fazer, ele me olhava com olhos desolados e sugeria que jogássemos
dominó ou que eu desenhasse. Eu não queria, eu queria fliperamas ou comprar
algum brinquedo novo, eu cansei das coisas usuais e simples. E ele me chamava
para jogar. Eu estava no meu quarto imersa na solidão, fazendo alguma coisa
irrelevante, ele batia a porta para me perguntar se eu queria jogar, e eu
respondia: -Não, é chato! E aos poucos, ele foi parando de me chamar. Nunca mais
me chamou, nunca mais jogamos.
O jogo de dominó? Não deixei minha mãe jogar fora. Ela faz questão de jogar tudo que não uso mais fora: Brinquedos, roupas, tudo. Está aqui
do meu lado. Fiz questão de pega-lo do armário, todo empoeirado. As letras
coloridas. Abri a caixinha, de madeira e um lado meio lascado, e vi as
pecinhas, cada uma única, sem nenhuma faltando. Meus olhos ficaram marejados,
olhando para o estado de abandono do jogo, me fez mal, queria que alguém se
divertisse com isso ainda. Não escorreram lágrimas, estas já secaram há muito.
Não falo mais com meu pai como eu falava. Com o tempo, eu
cresci, comecei a pensar mais sobre a expressão dos pensamentos políticos e
sociais dele, e cada vez mais percebi que discordava com tudo aquilo. Ia para
restaurantes com ele, cada um imerso em seu próprio celular, conversando com
pessoas mais aprazíveis.
E é isso, as últimas palavras que troquei com meu pai hoje
foram: - MEXI NA INTERNET SIM, FECHA A PORTA. E é isso, não falo quase nada com
ele, não jogamos mais dominó. Saudades de quando as coisas eram mais simples e
eu não o julgava pelos seus posicionamentos ou pelo fato de que ele está
desempregado desde que me entendo por gente. Ele era somente meu pai e eu sua
filha, e a gente conseguia se divertir.
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