Mariana, quarta-feira de sol. Em um ônibus lotado, normal.
Em pé, com a mochila entre as pernas, segurando a barra do veículo para não ser
arremessada para todos os lados. *Muda para primeira pessoa*. Estava sem meu
celular, no caso, sem bateria, e por isso, ativei meu senso de observação, dedução
e indução. Comecei a analisar as pessoas do ônibus, e vi que a maioria delas
estava entretida em seus aparelhos. Nisso, observei um indivíduo em especial:
Fulano. Não sei o nome dele, vai ficar fulano mesmo.
Aparentemente de estatura baixa (estava sentado), com uma barba grande, cabelos
pretos, um semblante comum. Uma tatuagem do símbolo comunista em vermelho no braço
esquerdo ( olhe que coincidência) , com uma frase ao lado. O que me chamou atenção
foi basicamente a conversa dele.
Fulano conversava, entretido, com alguém. Não sei, a imersão
dele no assunto me chamou a atenção. E então a xereta começou a fuxicar o que o
mesmo estava fazendo.
Ele conversava com uma garota, uma mulher chamada Fernanda,
apelidada no WhatsApp de ‘’Fernandinha bb”. Por um segundo, comecei a ponderar
se eles são aquele tipo de casal que se chama de coisas fofinhas e faz voz
melosa falando um com o outro, mas agora, em casa, penso que pode ter sido
Baixo Botafogo, onde ele pode ter a encontrado. Mas então, lendo sua conversa
de maneira bem discreta, vi que ela disse algo como “Bom dia bombonzinho, ou bonzinho”,
ou alguma coisa do tipo, e comecei a pensar que eles eram namorados. Mas não, não
eram.
Ele falava com ela, mandava suas mensagens, e enquanto ela
respondia, ele aguardava ansiosamente, sempre com o celular na mão, não abaixava
o aparelho nem a pau, ficava encanando a tela brilhante, esperando a mensagem
de retorno de Fernandinha bb. Teve um momento em que, tomado pela saudade, ele
abriu as mídias que havia compartilhado com ela, e lá havia uma foto da mesma,
vestida de índia, com uma linha vermelha atravessando o rosto horizontalmente,
cabelos negros lisos, pele amendoada, olhos negros. Achei bonitinha, digna do
apelido de “Fernandinha”. Fulano está um nome muito feio, vou chamar o cara de
Flávio. Flávio perguntou, uma hora, qual era o tipo de literatura que ela
gostava, o que me fez presumir que não eram namorados. Ela lhe disse que
gostava de ação, comédia, romances... e
Flávio respondeu o que ela achava do romance que eles estavam vivendo, ela
respondeu que era o melhor, ou seu favorito, ou algo do gênero, e ele
respondeu:
-Nhooooooooooo (coração)(coração
com um ponto embaixo).
Achei bonitinho. Queria estar vivendo isso também, e por um
segundo achei muito interessante o fato de que ele parecia totalmente estático
por fora, concentrado e sem emoções, mas estava digitando de maneira cheia de
júbilo. As pessoas fazem isso, rindo por dentro, mas uma máscara por fora que
esconde quaisquer mudanças de humor.
Flávio perguntou a Fernanda quais os autores que ela gostava
de ler , e a garota respondeu:
-Machado de assis, Graciliano, Lima Barreto... clássicos
brasileiros, e chegamos ao momento ápice da história, transcreverei a conversa:
-(...)
Flavio:
-Quer ouvir uma piada?
Fernanda:
-Manda.
Flavio:
-Quem castrou Castro Alves?
Eu ri daquilo internamente. Não iria rir de verdade pois ele
me acharia maluca e intrometida.
Ela riu, mandou várias carinhas risonhas. E entao comecei a
ponderar sobre como algumas pessoas não conseguiam ser expressivas em suas respostas,
e pensei que se fosse eu respondendo, iria dizer mais coisas, mostrar que
gostei da piada. E tinha mais.
Fernanda:
-E você tem a resposta?
Flávio:
-Tenho.
Fernanda:
-Qual é?
Flávio:
-Machado de Assis.
Ela riu, eu ri.
Depois disso, ele foi ver outras mensagens, seus grupos,
Facebook e afins, mas apenas focado em Fernanda, em sua resposta, todos os
outros eram irrelevantes perto dela. Pensei que estivesse bom de fuxicar a vida dos outros, deixar Flávio ouvindo seu
Gonzaguinha, e eu ouvindo vários nadas no meu fone de ouvido quebrado. Sentei na
cadeira atrás de Flávio e não pude mais ler suas mensagens, e quando descemos
do ônibus, nem ao menos me despedi visualmente dele... Espero que o romance com
Fernandinha bb vingue, que eles falem muito de literatura e piadas ruins, e
vivam muitas aventuras, eu apoio esse casal.