eu olho para o espelho e arranco a máscara que moldei, feita de vários restos de peles, discursos, cursos de rio. Rio, sem saber se é de ansiedade, desespero, ou uma tentativa última de tentar ser do time dos otimistas. Nunca, desde os sete anos, fui do time dos otimistas. Tento ver o que há por baixo dessa máscara de pele e vejo um abismo e um buraco negro que me devora a cada dia, enfio minhas mãos lá no fundo dele e dele retiro uma bailarina em um tocador de corda, não me lembro o nome disso. Boto a música para tocar, o buraco negro sugando tudo, quebrando meus móveis, fazendo as paredes colapsarem, enquanto escuto a doce melodia que me faz querer alinhar as estrelas mortas do meu espectro para que elas, em seu caos buraco-negrico, dancem para mim. Um ótimo espetáculo, é o que todos querem ver. Tiro um chapéu do meu buraco-negro, e agora estou um buraco-negro estiloso. Não consuma minha obra, ou ela é que vai te consumir, ela foi feita com meus orgãos, o que os juntava era o meu sangue. Ria, Arnaldo, ria. Ria que é melhor que continuar contorcendo o rosto com todo o turbilhão agonizante das mortes de milhares. Deito e rolo no chão, no sangue, meu rosto buraco-negro sugando as poeiras ao redor. Eu quero comer, devorar, processar tudo que passa pela minha frente , e agora flutuo no espaço e tudo virou um purê. Meio sem gosto, admito, gosto nem de terra, pois terra tem gosto de vida. O gosto que sinto é de marasmo, os gemidos da vizinha altos indicando que ela sente tanto prazer, oh, tanto prazer em continuar nesse confinamento com gosto de dipirona. Talvez eu seja um buraco negro colérico, porque estou com abstinência da droga copulatória, uma vez que minha fonte de serotonina secou. Que bom que pulaste fora, quando mal percebeste, eu iria quebrar seu rosto em dez mil pedacinhos e reordená-los conforme o meu desejo , e nem você se reconheceria mais. Ou não, talvez o rosto a ser dito seja o meu próprio, eu e a capacidade de ordena-lo e reordena-lo conforme meu desejo e tiro o buraco negro e aparece o rosto influencer, pego esse rosto, jogo-o no chão, vou usar de tapete da frente para as visitas, os gatos acabaram com o último. Pego meu rosto pessoa cansada da eternidade, não sei o que faço com ele, penduro-o no armário, onde será que estaria minha caneta da mesa digitalizadora? Escrevo, escrava das mãos, e da subjetividade, pois só ela consegue pegar toda a tristeza que tenho e enfiar nos meios, para um pedido de socorro da minha alma com ela mesma, só ela sabe a angústia que sinto ao descer as escadas, me deparar com pessoas que não tem nada a ver comigo, pessoas que gritam e ferem meus ouvidos com ruídos, e sou eu mesma ruído de uma matriz falha, rasa. Tiro meu rosto cansado, vejo um rosto cheio de vida, cheio de sonhos, digo a ele ''tenha paciência'', mas ao mesmo tempo, parece que sou o único motor impulsionador de desejo, talvez seja muito intensa, talvez seja densa, talvez eu devesse nadar em águas mais rasas, estou tão fundo que não vejo luz, não vejo peixes, não vejo nem os seres abissais. Estava com um amigo meu mais cedo, ele estava vendo televisão comigo, e eu sempre precisava me convencer que ele não estava comigo por causa do meu ar condicionado, e em certo momento eu realmente queria que ele saísse, que bom que percebeu. Porque chega um momento que eu canso de fingir , canso dos risos falsos, não rio, sou mar, já fui cachoeira, hoje sou só cacto. Sou um coquetel para causar perturbação no estômago. Sou tão nada e tão tudo, fico me perguntando quanto de tudo tenho, e sei que é tão pouco, que diante do universo o tudo se resume a nada, porque sou só uma célula agonizante vendo o câncer se propagar na nossa espécie, no nosso planeta. Somos células que superestimam seu próprio valor e desprezam e matam o outro, somos vis, cruéis, não quero carregar essa culpa, mas o que me resta? Como posso voar com tantos males, com tanto ódio que me suprime os pulmões como uma jiboia constantemente me lembrando que somos estupidamente imbecis e. Tiro minha máscara cheia de vida, ponho-a de lado também, não sei se minha alma minha cabeça tem sono, dormi a tarde inteira, não quero jogar, não estou a fim de ler pela vista cansada de horas , éons em ead. quero, sei lá. arrumar os personagens na mesa do galois.