Júlia e as obsessões
Obsessões por corpos, ele pensou. Obsessões para nos livrar do tédio, será? Será que relacionar-se é apenas esperar o brilho que sua própria expectativa pôs sobre um universo que é outro indivíduo espairecer, ir embora, para que você possa apaixonar-se por outro brilho da projeção que desejava consumir e ou/tornar-se? É uma tentativa falha, obcecado em procurar cumprir algo no presente se ausentando do presente. "Oi, eu ainda estou aqui'', diria Júlia se pudesse, ao perceber o rapaz se fechar como em uma concha de caracol e não mais sair. "É tão difícil'', pensa ela, lidar com pessoas que já vão estabelecer um pré julgamento ligado ao passado e presente delas, e não o que condiz com a realidade. Obsessões por personalidades, quiçá. Ela olha para a janela, fuma um cigarro imaginário para compor a cena que passa por sua cabeça neste exato momento. Ser obcecado por alguém é querer sugar, querer manter para si, querer devorar esta pessoa para assim tornar-se ela. Estaria Júlia obcecada por um corpo, mais um no meio de tanta carne? Não tanto, pensou. Há muita gente a que se devorar, e sua personalidade já é um amontoado de subjetividades. É necessário escolher com quem você abre sua alma e Júlia se despia como quem descascava uma banana. Mas o corpo, ah, o corpo trazia marcas para com as expectativas dos corpos com quem se relacionava, como pensar que alguma performance seria medíocre, quando uma troca muito mais presente se fazia antes, com mais intimidade ainda que apenas o encostar de peles?! O calor de palavras e de escuta em um mundo hostil era tão mais precioso, e não havia nenhuma necessidade em ser obcecado por isso. Júlia já foi obcecada por pessoas, sim, mas preferiu designar suas paixões mais ferventes para as artes, de todos os tipos. Por que perder tempo em uma obsessão, não há do que se anestesiar, para ela é preferível viver uma vida com anestesias sãs a se perder em ilusões pautadas em expectativas. O único presente que ela deseja ter é o momento presente, de sujeitos que queiram mirar em seus olhos e perceber a abertura, o carinho, a dedicação por estar lá, e não simplesmente julgar seu olhar endurecido e relatar friamente: - ela achou medíocre, foi embora porque desejava desejar mais o que uma paixão nova traria. Se alguma coisa ainda é permitida a Júlia, que ela reconsidere: - Ela achou sensível. Uma situação que passava por inúmeras violências de mente e corpo, o que denota-se como Uma Transa, são marcas: Uma próxima, já? Júlia não quer se apaixonar, quer amar aberta e completamente os indivíduos (e bichos) que transpassarem seu caminho, mas também quer lembra-los da liberdade que os mesmos têm de ir e vir. É fácil pintar a imagem de um ser insensível quando a iniciativa de pedir ajuda não é tomada. É fácil pintar a imagem de um ser buscando aventuras ou momentos empolgantes, sendo que não se conhece a fundo o mesmo. É fácil julgar, fácil os espaços vazios na cabeça preencherem com as piores camadas de auto depreciamento e ignorar o quanto os laços que foram tecidos foram importantes, foram, decerto, apoio. Obsessão, obsessão nem em buscar a paz, que ela seja encontrada no coração de Júlia, do rapaz, e de todas pessoas, que ela venha de roupas leves e riso sutil, que ela não esteja somente no momento de prazer, mas paz para que as feridas cicatrizem bem, no escuro.